Sob pressão…

Por: Prof Denílson Rocha / @denilsonrocha

A temporada mal começou e logo vieram as críticas aos trabalhos dos técnicos e os longos debates quanto a continuidade dos trabalhos. Os considerados três principais elencos no Brasil – Flamengo, Palmeiras e Atlético – têm seus treinadores bastante questionados e sob pressão. Porém, colocá-los em um mesmo contexto leva a interpretações e conclusões bastante distintas da realidade.

A situação de Abel Ferreira no Palmeiras é absolutamente inusitada. Assumiu um time desorganizado e, em pouco tempo, foi Campeão da Copa do Brasil e da Libertadores. Ainda assim, bastaram poucos meses para que seu trabalho passasse a ser questionado pela torcida, especialmente após perder dois títulos pouco relevantes em disputas de pênaltis.

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Já Rogério Ceni assumiu um Flamengo irregular na temporada 2020 e levou aos títulos do Campeonato Brasileiro e da Supercopa do Brasil. Também convive com as cobranças e questionamentos em um clube que vive com exigências para repetir uma temporada quase perfeita (2019), cujos resultados dificilmente seriam repetidos inclusive pelo treinador da época, idolatrado pela torcida.

O calendário absurdo desde a temporada 2020, as mudanças no elenco, a falta de pré-temporada ou o desempenho do time são ignorados. Até mesmo as conquistas recentes foram esquecidas. As situações de Flamengo e Palmeiras são exemplos bastante significativos do quanto não há racionalidade nas avaliações realizadas por parte das torcidas e reforça a crença de que gestores e dirigentes de clubes precisam ser bastante cautelosos quanto a ouvir a “voz das ruas” – atualmente, a “voz das redes sociais”.

Mas o que nos importa é o Atlético. E a situação do treinador Cuca é bastante diferente das situações que citamos anteriormente. Frequentemente pedido por parte da torcida que mantém a lembrança da conquista da América em 2013, Cuca está em início de trabalho, recebendo um Clube carente de títulos e com enorme expectativa de chegar a estas conquistas em função dos investimentos realizados.

A pressão no Atlético está, desde o ano passado, associada aos valores investidos em contratações. Sempre que os resultados ficam aquém do esperado, as avaliações citam os investimentos – cujas cifras (não oficiais) saíram de 200 milhões e, atualmente, já falam em 400 milhões. Mas dinheiro não ganha jogo. Há inúmeros exemplos de clubes que fizeram contratações por valores gigantescos e não tiveram resultado em campo. A histórica “SeleGalo” está sempre na memória dos atleticanos.

Em sentido contrário, alguns comentaristas alegam que o trabalho do treinador precisa de tempo para que os resultados apareçam. Assim, independente dos valores investidos e da qualidade do elenco, é preciso de tempo para o treinador implante sua filosofia de jogo e os resultados apareceram. O próprio diretor de futebol do Atlético, Rodrigo Caetano, usou deste argumento ao avaliar o trabalho do técnico Cuca, reforçando ser o início de um trabalho.

O problema é que o Atlético parece estar sempre em início de trabalho. Desde que Cuca deixou o Atlético em 2013, são 17 treinadores, entre efetivos e interinos. É um permanente reinício – não apenas pela troca constante de nomes, mas, especialmente, pela ausência de uma filosofia de jogo.

Quando o Atlético contratou Jorge Sampaoli em 2020, o discurso era de um projeto de longo prazo, com o treinador sendo responsável por uma restruturação significativa no elenco e a implantação de um novo modelo de jogo. Com muitas chegadas e saídas, o elenco mudou. O treinador foi muito questionado por ser pouco sociável e alguns resultados contra clubes da parte inferior da tabela geraram muitas críticas. A temporada terminou com uma 3ª colocação no Brasileirão, uma filosofia de jogo facilmente percebida – podendo gostar ou não – e o técnico deixando o Clube para um novo trabalho na Europa.

E vamos nós para um novo início de trabalho… E aí vem a pressão e os erros.

Não deveria ser um novo início. A continuidade de um trabalho não é feita por nomes de técnicos, mas, sim, por uma filosofia, por processos e metodologias que permanecem independente de quem está à frente do trabalho. E isso pôde ser visto no início da temporada 2021, ainda com o trabalho interino Lucas Gonçalves.

A pressão sobre o técnico Cuca é, então, resultado de um equívoco da diretoria. A contratação de um treinador com filosofia de jogo tão distinta da que o clube tinha até então provoca uma ruptura, uma interrupção no trabalho anterior e, naturalmente, a necessidade de mais tempo para implantação das novas características. Mas isso ocorre em uma temporada em que não há pré-temporada ou tempo para treinamentos. Não há tempo para mudanças, não há tempo para ajustes, não há tempo para assimilar uma nova metodologia. O caminho natural deveria ser de um treinador que desse continuidade ao modelo implementado e que, aos poucos, implantasse melhorias. Nada disso foi pensado. Sem qualquer questionamento às qualidades que Cuca possa ter, não é o nome com o perfil para o clube neste momento. Desta maneira, os decisores do Atlético tiveram uma decisão errada.

O técnico Cuca também errou. Um profissional tão experiente e conhecedor do mundo da bola deveria compreender que suas características são tão diferentes das que o Atlético tem no momento. Deveria ter aceitado o cargo? Decidindo aceitar (há muitos motivos para isso), sabendo não ter tempo para implantar sua filosofia de jogo, era o momento de buscar mudanças tão grandes? Um treinador com tamanha competência e conhecimento deveria compreender que as mudanças poderiam ser implantadas aos poucos, sem romper completamente com o trabalho anterior. Deveria reconhecer os acertos no que recebeu e focar na correção dos erros.

A pressão sobre Cuca está no fraco desempenho do time quando comparado ao que vinha sendo apresentado anteriormente. Em seus momentos de reflexão, Cuca deveria avaliar o que o time tem de melhor em relação ao que jogava antes da sua chegada. Existe alguma coisa? O Atlético evoluiu em qualquer quesito desde a sua chegada?

As decisões equivocadas já foram tomadas e não há como voltar no tempo para evitá-las. Agora, cabe buscar correções no rumo. Mas esta mudança só vai acontecer se houver uma postura bastante simples: HUMILDADE.

Primeiro, humildade do treinador para reconhecer que seu modelo de jogo não está apresentando bom desempenho ou bons resultados. Reconhecer que havia qualidades no modelo anterior e que são características que podem ser mantidas. Reconhecer que suas escolhas nas escalações não têm sido as melhores e que atletas pouco utilizados podem ter melhor desempenho.

Em sequência, humildade da diretoria para reconhecer que falta um projeto esportivo, que não há um direcionamento e uma filosofia sendo implantada no clube e que isso precisa ser definido com urgência. Reconhecer a que mudança de estilos e modelos é prejudicial ao Clube e que é necessário ter continuidade, independente dos nomes à frente da equipe.

Qualquer treinador que assumir o Atlético estará sob pressão. É natural em um Clube tão grande. É natural esperar o jogo vistoso. É natural esperar a vitória. É natural esperar conquistas de títulos. A permanente troca de treinadores aumenta a pressão. A constante troca de estilos e modelos de jogo aumenta a pressão. Contratações sem critério aumentam a pressão.

O Atlético precisa ter, realmente, um projeto de longo prazo, uma definição de filosofia de trabalho, métodos e conceitos de jogo. O Atlético precisa estar acima dos nomes. Precisamos deixar este eterno recomeço.