Coluna Preto no Branco: Quem pede recebe, quem desloca tem a preferência

Foto: Flickr oficial do Atlético

 

Por: Max Pereira /  @MaxGuaramax2012

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do FalaGalo.

Na natureza nada se cria, nada se perde. Tudo se transforma, já nos ensinou o notável físico Lavoisier. Nada permanece imutável. Até as células de nosso corpo se renovam de tempos em tempos. Com o futebol não diferente.

Os tempos do futebol romântico dos gênios Pelé e Garrincha, onde a técnica, a plástica e o lúdico ditavam o ritmo dos jogos, ficaram em um passado que já vai distante. E o futebol de hoje mostra que o esporte bretão também sofreu transformações ao longo dos anos.

Os grandes jogadores da atualidade, ainda que se lhes reconheça a técnica apurada e a capacidade inventiva, são muito mais festejados pelos seus sprints, pelas suas arrancadas e explosões físicas pontuais.

Alguns especialistas defendem que a evolução tática do futebol e a maximização da importância e o avanço das técnicas de condicionamento físico têm conspirado contra a arte e a criatividade. Para muitos, os esquemas táticos, cada vez mais rígidos, têm sufocado o talento e, com isso, a magia desapareceu dos gramados.

Ainda que o futebol dos tempos atuais esteja cada vez mais tático, físico e mental, uma máxima permanece imutável: “quem pede recebe, quem desloca tem a preferência”.

O futebol é um esporte coletivo e o jogo continua exigindo cumplicidade, participação, conjugação de esforços e que cada jogador se movimente e aja de forma interativa e solidária.

Mas, e a arte e o insight individual como ficam? Ainda há espaço para o jogador diferente? Até onde a criatividade, a capacidade de transgredir, de subverter a ordem tática estabelecida e de fazer o diferente estão comprometidas? E até onde os treinadores, no afã de impor as suas ideias de jogos, continuarão sufocando o talento e afastando a magia dos gramados?

Estas são questões que intrigam a muitos observadores e amantes do futebol e que devem ser respondidas pelos treinadores de hoje e, claro, por Jorge Sampaoli.

O técnico argentino do Galo disse, em recente entrevista, que seus times jogam assim como joga o Atlético há muito tempo. Se for assim, por que quando chegou ao Sevilla da Espanha, Sampaoli pediu logo de cara a contratação de Paulo Henrique Ganso e tão logo assumiu o Atlético não escondeu que queria contar com Cazares, antíteses dos meias armadores que o clube dispõe hoje em seu elenco e bem diferentes de Alan Franco e de Zaracho, contratados por sua indicação?

Estaria Sampaoli querendo dizer que há espaço para o talento refinado e transgressor em sua ideia de jogo? Ou esta seria apenas mais uma daquelas contradições tão humanas e normais que, vez ou outra, nos atormentam a todos nós e que estariam desafiando as concepções do genioso treinador? Sampaoli é humano, erra e acerta e, por certo, se questiona, ainda que externamente se mostre obsessivamente apegado aos seus conceitos. Pelo menos este é o senso comum.

O atual time atleticano tem oscilado com uma frequência e intensidade que ora leva o atleticano a sonhar e a gargalhar com a hipótese do título tão desejado, ora deixa o galista apaixonado sufocado com aquela sensação amarga de terra arrasada. É 8 ou 80.

Historicamente paradoxal e instável em todos os sentidos, o Atlético de Sampaoli também vai do céu ao inferno e da agonia ao êxtase em um abrir e fechar de olhos.

E não se ganha campeonatos de tiro longo sendo irregular ao extremo. Desde 1971, quando o Galo sagrou-se o primeiro clube a conquistar um campeonato brasileiro, os campeões têm sido, via de regra, os times mais regulares, i.e., aqueles que souberam driblar os momentos de baixa e permanecer a maior parte da competição estáveis e harmônicos.

O Brasileirão é uma competição que exige regularidade e elenco eclético e equilibrado. O Atlético tem sido punido ao longo dos anos por sempre fazer escolhas equivocadas, cometer e repetir um conjunto de erros dentro e fora dos gramados. Por isso, não canso de repetir que o que acontece dentro dos gramados é reflexo do que ocorre fora das quatro linhas. E mudar isso dos tem sido, ao longo dos anos, o grande e inglório desafio do Atlético.

O futebol cada vez mais não perdoa os erros. No artigo “DNA DE CAMPEÃO: TER OU NÃO TER, EIS A QUESTÃO” escrevi que “ser campeão passa por detalhes”. E um desses detalhes é trabalhar e agir tendo o erro zero como limite a ser perseguido. O campeão é sempre aquele que erra menos.

E, no futebol de hoje, sistêmico e multibilionário, é também fundamental, mais do que nunca, o trato competente e politicamente forte das questões extracampo. O clube tem pecado historicamente também nessa frente.

Para muitos e, confesso para mim próprio, o Galo mostrou contra o Internacional que, definitivamente, não tem cacife para ser campeão este ano. Dirigentes, treinador e atletas estão errando em demasia. Claro que o campeonato está aberto, tudo pode acontecer e não dá para dizer quem vai ser campeão. Mas, o Galo se descredencia cada vez mais.

Em 20/11 publiquei no Blog Canto do Galo o artigo “A BOLA PUNE”. O empate amargo com o Inter foi consequência de uma soma de erros individuais, coletivos, de postura e de escolhas equivocadas dos atletas e do treinador. O Galo errou e a bola puniu.

Mas, como conjugar esse sentimento de terra arrasada com uma postura racional, equilibrada e proativa? Essa é a pergunta que sempre faço a mim mesmo. E passo adiante.

O Atlético em plena disputa do Brasileirão viveu mais uma de suas eternas crises politicas, foi sacudido pelas eleições municipais e por um surto de Covid 19, está em pleno processo de transição de seu comando central e, apesar de algumas incursões infelizes de seus dirigentes nas redes sociais, aparenta entrar em uma calmaria incomum e insuspeita, fato festejado por Rubens Menin que comemorou, segundo ele, a paz e a união no universo politico do clube.

Mas, para que o futebol atleticano tenha paz, flua natural e harmonicamente e para que Sampaoli e todos nós atleticanos possamos festejar dentro de campo ainda é preciso exorcizar muitos demônios que ainda insistem em infernizar o jogo atleticano. Só assim, quem pedir receberá e quem se deslocar terá a preferência.