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Coluna Preto no Branco: o fogo amigo e a guerra dos cliques

Foto: Reprodução

 

 

Max Pereira
19/08/2020 – 06h
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Com este texto completo uma trilogia iniciada com os artigos TUDO O QUE ACONTECE DENTRO DE CAMPO É CONSEQUENCIA DO QUE OCORRE FORA DAS QUATRO LINHAS” e “ENTRE O SUCESSO E O FRACASSO HÁ UM CAMINHO LONGO E DESAFIADOR PARA O ATLÉTICO E O SEU FRENÉTICO TREINADOR”.Tal como os dois lados da mesma pinça, a crítica e a autocritica são o oxigênio do bom jornalismo.

Originalmente, o “ombudsman” no jornalismo, cargo criado como forma de prestação de contas ao público, é hoje uma função puramente crítica e independente, como bem o definiu a Folha de São Paulo, primeiro jornal brasileiro a abrir espaço para essa atividade: “O Ombudsman traz ao leitor os erros da Folha”. Tratava-se de chamada para coluna de estreia de Caio Túlio Costa, o primeiro ombudsman da imprensa brasileira, sob o título: “Quando alguém é pago para defender o leitor”.

A espessa parede que um dia dividiu os meios de comunicação de seus leitores ruiu. A máquina de demolição tem nome: redes sociais. Com elas, as críticas chegam instantaneamente, já que o público tem acesso direto aos veículos. Diante deste cenário, há quem defenda o fim da necessidade de um ombudsman, o jornalista designado a avaliar o jornal e atender o leitor. O termo ombudsman tem origem sueca e significa “aquele que representa”.

Ao contrario, o “ombudsman” se obriga a se reinventar e, cada vez mais, o jornalismo sério não pode prescindir de seu trabalho independente, crítico e imparcial. E é por inexistir alguém que faça esse papel nos veículos das redes sociais, que eles, sem limites críticos e senso jornalístico, estão se perdendo e se tornando mais do mesmo. Muitos, inclusive, acabam sendo meros repetidores de setoristas profissionais, sendo incapazes de produzir uma critica própria, investigar, dissecar e mostrar o outro lado da notícia, essência do que se entende por jornalismo.

Em abril de 1996, tendo Alberto Dines como seu editor, foi criado o “Observatório da Imprensa”, uma iniciativa do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor) e um projeto original do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Universidade Estadual de Campinas.

O “Observatório da Imprensa” era um website e programa de rádio e TV brasileiro cujo foco era a análise independente e imparcial da atuação dos meios de comunicação em massa no país. Crítica e autocrítica, a mola mestra desse projeto.

Uma particularidade dos veículos das redes sociais é a sua identificação ideológica, partidária, clubista, religiosa ou  de qualquer outra natureza, o que tradicionalmente não se verifica na mídia convencional brasileira, como é costumeiro, por exemplo, na imprensa norte-americana.

Neste artigo, considerando a irrefreável incapacidade do Glorioso de se blindar, aos seus profissionais e às suas ações e informações estratégicas, buscarei mostrar que a relação clube/torcida/mídia/imprensa/redes sociais precisa e, muito, ser trabalhada e cuidada.

Sei que vou percorrer um terreno pantanoso e que, certamente, desagradarei a gregos e troianos. Mas, sou um provocador nato. E, por isso, quero estimular uma profunda reflexão sobre o papel desse novo tipo de formadores de opinião, em especial dos atleticanos no trato das coisas do Glorioso.

Como nos ensinou um dos pais da Sociologia Moderna, Émile Durkheim, o objeto de estudo da Sociologia deve ser o fato social, pois dele deriva a própria vida em sociedade, caracterizada pelo seu conjunto. E o que isso tem a ver com o assunto deste artigo? Explico:

O que caracteriza um fato a ponto de ser ele considerado um fato social não é a sua generalidade e, sim, a influência dele nos padrões sociais e culturais da sociedade como um todo. Os fenômenos sociais, portanto, não são individuais. De outra forma: os acontecimentos e decisões pessoais não são considerados, pela Sociologia, como fenômenos sociais.

Mas, os comportamentos, ações e situações observadas em determinadas sociedades, organizações e grupos, sim, são fenômeno sociais. E estes podem ser resultantes tanto de fatos positivos quanto negativos, como podem produzir boas ou más consequências.

Youtubers, blogueiros, jornalistas, articulistas, profissionais ou não, cronistas, comunicadores, comentaristas, repórteres, apresentadores são influenciadores e, como tais, ditam comportamentos e tendências. Muitos, entretanto, não se mostram à altura e, muito menos, conscientes dessa responsabilidade.

E como mais e mais atleticanos vão se identificando com esses novos comunicadores que torcem, vibram e sofrem como ele, mais importante se torna refletir sobre essa nova onda de comunicação e geração de informações.

A pandemia vem mudando os comportamentos, as relações humanas e a forma de se ver o mundo e a própria vida. Nesse cenário pandêmico o isolamento social, a paralisação forçada de várias atividades, o fechamento do comércio, o uso obrigatório e sanitário da máscara, a preocupação quase obsessiva com a higienização, o trabalho em Home Office, a ausência ou deturpação das informações, a overdose de fake news, a polarização política, a cultura do ódio, o disse me disse sobre o vírus, o pipocar de denuncias, com ou sem confirmação, o crescimento galopante do desemprego e as perspectivas sombrias da economia, são, dentre outros, ingredientes, por si só, estressantes e explosivos. Tudo junto e misturado, então… .

O torcedor apaixonado agrega naturalmente a essa lista a saudade de ver o seu time em campo e a impossibilidade do resgate catártico de suas frustrações por meio das vitórias do clube de seu coração.

O Atlético nestes tempos de pandemia tem jogado com a emoção de seu torcedor muito mais fora de campo do que dentro das quatro linhas. Refiro-me ao tom histriônico, “bombástico” e sensacionalista do noticiário atleticano nas redes sociais e na própria imprensa convencional.

O isolamento social favoreceu o surgimento de “n” canais atleticanos nas redes sociais que, não obstante, se relacionarem respeitosa e cordialmente, acabam estabelecendo entre si e com a mídia tradicional uma guerra pela audiência que forçosamente tende a deixar os interesses do Atlético em ultimo plano.

Nunca é demais lembrar que a chegada do afamado e histriônico treinador argentino mudou, no imaginário do atleticano, todas as suas perspectivas sobre o que estaria reservado ao Glorioso nesta que é tida como a competição mais difícil e, normalmente, sem prognostico, do planeta. E o argentino cada vez mais faz o galista sonhar e continuar sonhando sempre mais e mais alto.

Esse atleticano, apaixonado e inebriado pela perspectiva de, finalmente, poder ver o seu time vencedor do Campeonato Brasileiro depois de 49 anos, está sendo bombardeado por uma serie de especulações e de “furos” que são despejados em suas cabeças sem nenhum senso critico e sem a mínima razoabilidade. Por exemplo:

“Marquinhos de saída?”, “Otero oferecido ao Athletico do Paraná?”, “Athletico do Paraná diz que só aceita Otero por empréstimo se Atlético pagar os salários do jogador?”, “Flamengo fez contato com o Atlético sobre Guga”, “Está certo: Guga vai para o Flamengo”, “Guga só sai se for para o exterior”, “Guga fica no Atlético”, “Atlético oferece Victor, Otero e mais 5 milhões de reais ao Santos por Sasha”, “Santos recusa proposta do Atlético e quer 32 milhões de reais por Eduardo Sasha”, “Otero no Timão”, “Otero vai para o Corinthians por empréstimo, com o Atlético pagando 50% dos salários do jogador. E o Corinthians ainda terá direito a um percentual na venda do jogador, caso o negócio seja efetuado enquanto ele estiver atuando pelo time do Parque São Jorge”, “Mailton, fora dos planos de Sampaoli, perde espaço e deve deixar o atlético”,  “Igor Rabello na Europa? Atlético, empresário e jogador, insatisfeito com a reserva, querem todos a efetivação do negócio com algum clube europeu e o Galo se mexe para viabilizar”,  “Otero e Cazares podem desembarcar no parque São Jorge. Combo é bem visto pelos dois clubes” “Será o fim do time de transição?”.

Ainda sobre Otero e o Timão foi também veiculada a “noticia” de que o time paulista estaria aguardando o desfecho de uma rescisão amigável entre o Atlético e o jogador quando, então, o meia venezuelano ficaria livre para acertar o seu vinculo com o Corinthians. E pasmem: o Timão teria sido informado de que, como o Atlético quer se ver livre do jogador e de seus salários, uma rescisão amigável estaria nos planos da diretoria atleticana. Chapéu de trouxa é marreta, não é mesmo?

Ah! Se Sampaoli está testando Mailton em função diversa daquela que o lateral está acostumado a jogar não interessa. O importante é especular sobre uma possível saída do jogador. Dá mais Ibope. E daí se no Rio de Janeiro está se falando que o lateral direito chileno Maurício Isla é a primeira opção do Flamengo para substituir Rafinha? Eu quero é falar do Guga.

E o Cazares? Buscando melhor sintetizar tudo o que se fala sobre o equatoriano, peço licença ao comentarista atleticano Lélio Gustavo para parafrasear uma de suas falas mais marcantes: “Cazares, tem gente que quer que você vá para o colo do capeta”.

“Fulano, beltrano e sicrano oferecidos”. Para quem? Ora, ao Atlético, que está agressivo no mercado, ora pelo próprio Atlético que, premido pelas dividas, tem que fazer caixa e precisa vender alguém, mais alguém e outro alguém.

A famosa lista de contratações pedidas por Sampaoli ganha um novo nome a cada dia. O atacante chileno Eduardo Vargas e a mulher dele foram, inclusive, vistos entrando em uma clinica FICTÍCIA do Dr. Rodrigo Lasmar no bairro Belvedere para fazer os exames médicos para assinar o contrato com o Atlético.

Alguém duvida que uma ou outra incursão do Atlético no mercado pode não ter dado em nada graças a vazamentos indesejáveis e  temerariamente explorados nas redes sociais atleticanas? E, antes de criticar, esta ou aquela plataforma por ter veiculado o interesse ou a investida do Atlético neste ou naquele jogador, é preciso cobrar primeiro  do clube e de seu comando por terem deixado, como quase sempre acontece, aberta a torneira onde normalmente se dá esse tipo de vazamento.

Não é preciso ser vidente para saber que, da mesma forma que este tipo de “noticiário” especulativo e, principalmente, depreciativo sobre quem pode sair e porque pode sair desagrada aos atletas e ao treinador, vez que  pode corromper a confiança dos jogadores na diretoria e corroer o ambiente, também esse disse me disse sobre quem vai chegar e como vai chegar,  deve incomodar bastante a Sampaoli, ultimo interessado em ver as tratativas atleticanas fracassarem.

O treinador argentino também deve ter ficado muito “satisfeito” com o vazamento de sua conversa com o presidente Sette Câmara, principalmente da forma que foi e a consequente exploração do fato.

Aliás, o assunto tratado nessa conversa deveria ficar restrito aos intramuros do clube. Primeiro, porque a confiança, a discrição e o sigilo são base de um relacionamento perene e firme. E, segundo, porque tudo o que os inimigos do clube querem é um mote para desestabilizar o Atlético. A diretoria e os atleticanos não podem perder de vista que Sampaoli é sonho de consumo de outros clubes do eixo. Tirá-lo do Atlético agora seria um golpe supremo.

Não foi por outra razão que o jornalista Heverton Guimarães criticou duramente o presidente Sergio Sette Câmara pela entrevista que o mandatário atleticano concedeu à TV Galo, na qual revelou o teor de sua polêmica e famosa conversa com Sampaoli.

Há momentos em que uma notícia veiculada, aqui ou ali, soa como um recado a possíveis interessados por algum jogador. De outras vezes, a informação, da forma que é divulgada e explorada, acaba funcionando como gatilho para gerar crises e produzir problemas para o clube, quando não atrapalha algum negócio em curso.

Os jornalistas profissionais se defendem dizendo que, se a notícia chegou, é sua obrigação divulgá-la para o seu publico sem se preocupar com os possíveis danos que a sua divulgação possa causar ao clube objeto ou fonte da informação.

E não há como não concordar com eles. A forma, contudo, como alguns divulgam a notícia e a especulam é que é, por vezes, merecedora de criticas e de reprovação. Dar uma noticia é uma coisa. Explora-la com algum viés tendencioso ou distorce-la é outra coisa bem diferente. E isso acontece com uma frequência indesejável.

Fazendo minhas as palavras de Mauro César Pereira, cabe ao clube fechar a torneira e impedir qualquer vazamento o que, infelizmente, o Atlético nunca sobe fazer.

Se as ações de agentes externos hostis ao clube, independentemente de qualquer ajuda,  já são quase sempre danosas ao Glorioso, porque o clube os atleticanos devem municiá-las e potencializa-las?