Um réquiem encomendado

 

 

Max Pereira
Do Fala Galo, em Belo Horizonte
21/10/2019 – 06h

Já escrevi e não canso de repetir que a história atleticana é feita de acasos, improvisos, ações isoladas e, principalmente, de malabarismos financeiros, que buscam driblar os crônicos e sufocantes problemas de caixa gerados e multiplicados pela incúria e pelos erros de seus próprios dirigentes ao longo dos anos.

Não é menos verdade que ao longo dos tempos os dirigentes atleticanos, para quem a vaidade e a autossuficiência têm sido as características mais evidentes, têm buscado dar ao clube uma cara com as suas cores e tintas, o que, aliás, é absolutamente natural e previsível se tratando de uma instituição fechada e conduzida no estilo feudal.

Com Sette Câmara não tem sido diferente, embora seja forçoso, por amor à verdade, destacar uma mudança de perfil da temporada anterior para a atual, em que pese o inescondível desastre no trato do futebol.

Em “AUTOCRACIA X DEMOCRACIA: O PARADOXO ATLETICANO”, publicado aqui no Fala Galo, afirmei que é inegável que, nessa atual temporada e, sob vários aspectos, a gestão Sette Câmara tem sido bem diferente do que foi no primeiro ano do atual presidente à frente do Atlético.

Nesse sentido, falei de alguns sinais, ao meu ver, realmente positivos, indicadores de uma possível evolução interessante.

Mas ao mesmo tempo, alertei que como sempre nem tudo eram flores e que, por isso, resistia em ser otimista e me negava em reconhecer em definitivo que o Atlético estaria mesmo passando por um processo de profissionalização efetivo e realmente transformador.

Episódios como os que ocorreram na última eleição para o conselho e na recente eleição do presidente deste órgão, ambas com chapa única, indicam que o clube desagradavelmente ainda não se submete a práticas democráticas e participativas que não podem mais fazer parte da história do clube.

Sette Câmara estaria mesmo fazendo uma boa gestão do ponto de vista financeiro e administrativo? Essa “transformação” do clube em “empresa” é mesmo para valer ou seria apenas a montagem de uma base para a perpetuação de seu poder e de seu grupo no clube?

O que de fato significam as contratações de Rui Costa e de Júnior Chávare?

Há gente que responde positivamente à primeira questão. Segundo estes, Sette Câmara estaria de fato reequilibrando as finanças do clube, baixando o endividamento, dando ao Atlético uma nova cara e, principalmente, dando um recado muito importante para o mercado, o que poderia atrair, em médio prazo, grandes investidores.

Em relação aos diretores, em que pese ser muito cedo ainda para se avaliar com propriedade o trabalho de ambos, é clara a sensação de que estão sendo levados, gradual e inexoravelmente, para a fogueira. E quem perde com tudo isso é o próprio clube.

Se é fato que na atual temporada a direção atleticana está dando alguns sinais francamente positivos na direção de um clube mais profissional e eficiente, como mostra o trabalho que Chávare vêm fazendo na base do Atlético, não é menos verdade que muita coisa precisa de ser feita para que o clube se torne de fato um time vencedor e campeão.

Aqui é preciso destacar que esses esforços têm sido insuficientes. Salários e direitos de imagem em atraso e perspectiva de descontinuidade do trabalho iniciado na base em razão de incontornáveis dificuldades financeiras sinalizam um fim amargo de temporada e um início nebuloso de 2020.

Sem planejamento e sem receita, como competir de igual para igual com orçamentos três vezes maiores?

O Atlético é um time em eterna ebulição, que busca consolidar uma forma de jogar. E Sette Câmara não só tem sido incompetente para mudar essa história, como tem, ele próprio, com sua inapetência no trato do futebol, colocado gasolina no fogo.

Não se pode dizer que ele, de certa forma, não renovou o elenco mas não buscou no mercado nomes de relevo no futebol, ou que pudessem dar ao time a consistência desejável para sustentar, com chances reais de título, uma campanha em uma competição de tiro longo como o Brasileirão.

Não, não fez nada disso. Não houve apuro, planejamento, ou seja, decidiu e agiu sem levar em consideração as exigências da temporada e sem sopesar as implicações do perfil físico atlético e etário do grupo que montava, além das possibilidades táticas que o elenco formado poderia oferecer.

E o resultado de tamanho desleixo é um elenco desequilibrado em vários aspectos, carente de opções táticas e engessado por um perfil físico, atlético e etário que, necessariamente, leva a qualquer formação que entrar em campo a praticar um futebol lento, burocrático, previsível e potencialmente nulo.

Nenhuma palavra define melhor esse Atlético pavoroso que tem protagonizado estes recentes fiascos que IMPOTÊNCIA.

Mesmo quando se mantinha no G-4 do atual Brasileirão durante boa parte do primeiro turno, e tendo ficado apenas a cinco pontos do líder, na época o Santos, e dos maiores favoritos ao título naquele momento, Flamengo e Palmeiras, o Atlético não conseguia inspirar confiança em uma parcela significativa de sua torcida.

Curiosamente alguns atleticanos, mesmo sem esconder uma ponta de pessimismo em relação ao atual Brasileirão, ainda defendiam a manutenção do hoje odiado e nada saudoso Rodrigo Santana, e a continuidade do trabalho, além da necessidade de reforçar o elenco para os próximos anos.

O título brasileiro para o Atlético tornou-se ao longo dos tempos, por razões sabidas, um objetivo cada vez mais improvável de se realizar e para a grande maioria de sua massa torcedora é difícil acreditar na possibilidade de alcançar tal objetivo.

E essa espera de quase meio século para a conquista do tão sonhado bicampeonato do Brasileiro tem sido algo torturante para sua imensa e apaixonada massa torcedora.

Mas o maltratado e esquizofrênico torcedor atleticano ainda não aprendeu como exigir muita competência, profissionalismo e erro quase zero de quem comanda seu clube de coração.

Cabe a cada atleticano buscar as respostas a estas questões e se questionar sobre o que ele pode fazer a respeito.

Com A ALMA ATLETICANA E A GRAMA DO VIZINHO cada vez vez mais valorizada nos corações e mentes galistas, o que se tem visto é o próprio atleticano anunciar o fim do clube.

Nas redes sociais e em várias rodas, atleticanos são flagrados aqui e ali desfiando discursos deprimentes que colocam em xeque o sagrado sentimento de “atleticanidade”.

Já vi esse filme várias vezes. Essa onda de acabar com o sentimento de “atleticanidade” já se espalhou outras vezes. Muitas vezes, o sentimento é deflagrado estimulado por agentes externos.

Hoje parece mais desgastado. Parece coisa só de cruzeirense, mas não é. No seio da massa estão surgindo mais e mais torcedores zumbis, hipnotizados e brochados. QUEM É DE LUTA E NÃO DE LUTO TEM DISCURSO E PRÁTICA BEM DIFERENTES.

Teses como abdicar do PPV, deixar de ser GNV, público zero e escrachar jogadores, mais do que desviar o foco das questões centrais é o mesmo que abandonar o clube. Apenas justificam a omissão, o não fazer nada de prático e de efetivo em prol de uma mudança verdadeira. Não é movimento sério, proficiente. Todos aqueles interessados na manutenção desse status no Atlético, inclusive os inimigos externos, agradecem.

O ex-presidente Kalil em vídeo mais ou menos recente e, continuamente requentado nas redes sociais, fala que ser atleticano faz mal.

Erra feio o ex-dirigente que, por ser ídolo de grande parte da massa e ganhador do maior título da história do clube, é importante formador de opinião e, por isso, ao dizer o que disse, contribui significativamente para a perda de forças desse sentimento de “atleticanidade”. Espero que ele reveja esse ponto de vista, tenho certeza, produto de um momento infeliz.

Muitos atleticanos se dividem entre limpar mais uma de suas crises eternas e curtir a decadência do rival, convulsionado em uma crise sem precedentes na história daquele clube, ameaçado como nunca de rebaixamento e de submergir de vez em escândalos infindáveis.

Sem me intrometer nas questões do lado de lá, é fundamental perceber que sendo o futebol sistêmico, aconteça o que acontecer com o time azul, o Atlético não passará impune ou ileso.

É claro que, com as desavenças internas que racharam a situação e a briga pelo poder instalada, o clube tende a ficar cada vez mais fragilizado, o que faz crescer a possibilidade de o Atlético ser arrastado para o mesmo buraco em que o rival está caindo.

Jogar o Atlético no precipício é estratégia que interessa a quem?

A quem de fato interessam o “cortejo fúnebre” atleticano?

Uma coisa é certa: não interessa nem ao Atlético, nem a atleticano algum.

Sair desse vitimismo doentio e da autodestruição é o primeiro passo.

No artigo que inaugurou essa coluna, CONSTRUIR UMA IDENTIDADE VENCEDORA E CAMPEÃ É MISSÃO INDELEGÁVEL DO ATLETICANO, chamei a atenção para o fato de que ao longo de sua história, o Atlético se “permitiu” marcar com o signo da impotência, da derrota, do fracasso e do sofrimento.

Também mostrei que nós atleticanos sempre fomos “os primeiros a abaixar as cabeças e a normalizar esse estado de coisas, a bater no peito doído e gritar aos quatro ventos: SE NÃO FOR SOFRIDO NÃO É ATLÉTICO!

Por isso, defendi naquele ensaio e volto a fazê-lo agora, que somos nós atleticanos que temos que remover da história e da vida do Atlético esse estigma maldito. E, para isso, é preciso aprender a cobrar e, principalmente, a agir, a lutar por isso. SE O ATLETICANO NÃO O FIZER, NINGUÉM MAIS O FARÁ. É missão indelegável.

Repito: é preciso romper de vez com esse espírito vitimista que nos leva a ruminar de forma masoquista esse sofrimento mórbido e doentio.

POR ISSO É FUNDAMENTAL QUE NÓS TRANSFORMEMOS A NÓS MESMOS PRIMEIRO. Só assim conseguiremos transformar o clube e abolir de vez da vida e da história do do Atlético este carma de derrotas humilhantes, de eliminações doídas e de fracassos.

A missão de reconstruir o Atlético exige de cada atleticano que coloque sua cara a tapa e saia de sua zona de conforto o que, convenhamos, é tarefa muitas vezes dolorida. Mas é preciso lembrar que aqueles que assumirem essa missão não estarão sozinhos. Olhe para o lado e identifique os parceiros.

É essa a reflexão que quero renovar, afim de despertar em você a percepção que só nós torcedores é que podemos mudar essa realidade perversa que nos machuca tanto.

O Atlético DEFINITIVAMENTE NÃO MORREU, simplesmente porque eu, você e milhões e milhões de atleticanos continuamos vivos, como aquele garotinho que viralizou nas redes sociais brandindo sozinho a bandeira alvinegra ao final de um jogo recente no Horto, em que o Galo colhia mais um resultado decepcionante.

Esse garoto definitivamente não é um morto-vivo e o clube que embala a sua paixão e faz os seus pequenos olhos brilharem também não.
Está mais vivo do que nunca.

 

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Edição: Ruth Martins
Edição de imagem: André Cantini