Por: Prof Denilson Rocha
Até o dia 30 de abril, os clubes brasileiros deviam publicar seus balanços patrimoniais relativos ao ano de 2018. Até pouco tempo atrás, raramente víamos artigos nos principais jornais e poucos torcedores davam atenção a estes números. Agora, ficamos mais conscientes do quanto dirigentes corroeram as finanças dos Clubes, seja por incompetência, seja por outros interesses. E o Galo sofreu tanto, por tanto tempo, que nós, torcedores, estamos quase nos especializando em gestão financeira para tirar o Clube da beira do abismo.
Já foram publicadas diversas avaliações do balanço patrimonial do Atlético e vamos buscar não ser repetitivos. Então, vamos começar com uma comparação simples e direta com o que foi aprovado como orçamento. Aí temos um verdadeiro show de horrores. Aqui, neste mesmo espaço, logo após a publicação do orçamento para 2018, já havíamos alertado que aqueles números eram uma obra de ficção. E não deu outra… As diferenças entre o planejado (orçamento) e o realizado (balanço) são absurdas!!! A previsão de receitas de bilheteria foi 327% acima do que foi alcançado. Do GNV, 117% acima do real. TV, 20% acima. Patrocínios, 30% acima… O único desvio “a favor” foi a venda de atletas que ficou 38% maior que o previsto.
Tantas variações entre previsto e realizado demonstram a total inadequação na elaboração do orçamento e nos planos de ação para cumprir com o plano apresentado aos conselheiros. O orçamento apresentado como base para 2018 foi elaborado ainda na gestão Nepomuceno. Houve mudanças no orçamento apresentado para 2019, mas ainda carecem de planos de ação (como fazer). E, aqui, vale um ponto importante: não adianta ficar reclamando a aprovação do balanço porque é um documento que mostra o passado, um retrato dos números em 31 de dezembro. Se os números apresentados eram reais, por pior que sejam, o balanço é aprovado. O que precisamos ter atenção é no orçamento e, especialmente, acompanhar mês a mês (e o Atlético deveria ter a OBRIGAÇÃO de apresentar esses números, mas não faz) como está sendo realizado.
Sem alongar demais em aspectos que já foram tratados por vários outros autores, vamos apresentar apenas alguns pontos de atenção.
- Falando das despesas, a tal “austeridade”, por mais incrível que pareça, esteve presente. A redução, em relação a 2017, foi de quase 20% nos custos gerais. Se considerar apenas o futebol, a redução foi de 15%.
- O endividamento do Atlético continua alto e ficou ainda maior em 2018 (10% no curto prazo e 13% no longo prazo). Ainda assim, é possível observar a busca de alteração no perfil, com redução nos empréstimos de curto prazo e a ampliação nos de longo prazo. Isso dá fôlego ao Clube. É preciso buscar explicações quanto ao aumento do endividamento com empresas e quase 18 milhões, apresentada como “diversos”.
- O que mais chama atenção é a redução das receitas. O valor das receitas de bilheteria foi o equivalente a 28% do que havia realizado em 2014, sem considerar a inflação no período; o Galo na Veia teve nova redução na arrecadação, agora 16% menor que em 2017; e o patrocínio ficou 30% menor porque o contrato com a Caixa previa bônus baseados nos resultados em campo. Seja a bilheteria, GNV ou patrocínio, fica bastante claro que a falta de resultados esportivos afeta diretamente os resultados financeiros. A falta da Libertadores e as desclassificações precoces na Copa Sulamericana e na Copa do Brasil afetaram a geração de receitas.
Avaliar as receitas do Atlético mostra uma situação surreal: a dupla Inter e Grêmio tem, a cada ano, aproximadamente 70 milhões de receitas com bilheteria e sócio torcedor. E vale destacar que o Inter não esteve nas competições sul-americanas em 2018. Se o Galo arrecada por volta de 23 milhões com essas fontes, temos uma diferença anual de quase 50 milhões. Isso seria suficiente para o Atlético fechar o ano com um superávit de quase 30 milhões (ou, ao menos, deixaria de recorrer a novos empréstimos).
O que acontece no Atlético que parece não ter interesse em aumentar suas receitas? Por que as rendas provenientes da bilheteria e do GNV diminuem ano a ano e nada é feito?
O problema do Galo, atualmente, não é o endividamento. É a geração de receitas!
Frequentemente, temos citado o que o Grêmio adotou: ajuste de contas, equacionamento das dívidas, aumento das receitas, captação e formação de atletas. O resultado é visto tanto dentro quanto fora de campo – e não precisou vender qualquer shopping para isso. Sem qualquer apego ao shopping, é importante compreender quais interesses (legítimos ou não) para colocar essa venda como única solução para o Atlético. Porque, sendo muito simples e direto, decidir pela venda de um patrimônio sem termos visto qualquer iniciativa para aumentar as demais receitas é, no mínimo, estranho. Pode nos suscitar questionamentos, por exemplo, de um novo aumento do endividamento por absoluta falta de capacidade de gerar novas fontes de receitas ou de melhorar as já existentes. Seria como gastar o que foi economizado em sua poupança para cobrir despesas diárias, sem perspectivas de aumento de sua fonte de renda. Ou seja, em pouco tempo não haverá mais poupança, mas suas necessidades continuarão as mesmas ou até irão aumentar com o passar do tempo. Só que não terá mais de onde tirar para cobrir.
Mas estas avaliações ainda não são suficientes. Como tem sido a evolução dos números do Atlético nos últimos anos? Considerar as heranças das diretorias anteriores não é reduzir a responsabilidade da diretoria atual. Afinal, o atual presidente faz parte do grupo dominante do Atlético desde antes da gestão Kalil.
Considerando, então, os balanços de 2013 a 2018, temos o seguinte:
- As receitas de bilheteria são as menores registradas, confirmando que há um problema grave nesse quesito.
- Ainda que o número de sócios no GNV cresça (ao menos na divulgação), isso não se reflete em arrecadação, que jamais chegou sequer a 20 milhões anuais.
- Os 171 milhões em TV no último ano da gestão Nepomuceno foram fruto de antecipações e do recebimento de “luvas” pelo novo contrato. Isso foi suficiente para esconder a situação grave das finanças do Clube naquele ano. O valor de 2018 foi 42% inferior.
- As arrecadações com “outras atividades desportivas” vêm caindo ano a ano. Já foram 18,6 milhões em 2013 e fecharam em 8,6 milhões em 2018.
- Os custos totais foram os menores dos últimos 5 anos, especialmente com a redução nos custos operacionais. Se os custos passaram dos 300 milhões nos anos de 2014, 2015 e 2017 (quando chegou a incríveis 331 milhões), ficaram em 268 milhões em 2018.
- Os custos com “salários e direitos de imagem” com o futebol tiveram um salto superior a 40% de 2015 para 2016, saindo de 88,5 milhões para 124,7 milhões.
- A principal redução aparece nas despesas financeiras (que inclui o pagamento de juros de dívidas). Em 2014, foram 78,6 milhões nessa rubrica. Em 2018, foram 18,7 milhões. Entretanto, esse valor foi “mascarado” com um lançamento de 38,6 milhões de créditos sub judice – é legal, mas envolve risco.
É fácil identificar que os itens a, b e d sofrem forte influência do desempenho do time em campo. E este desempenho está muito atrelado a contratações ou revelações. Enfim, o estímulo do torcedor a frequentar estádios e sujeitar-se a pagar um pouco mais no preço de um ingresso é diretamente proporcional ao rendimento que o time consegue ter nos diversos torneios que ele disputa. E nisto podemos ver um desempenho ainda mais correlacionado quando se analisa torneios de grande impacto financeiro e de mídia, como a Copa do Brasil e a Libertadores da América. A premiação e a visibilidade destes torneios, também influenciam no ânimo dos torcedores a gastar não somente com ingressos e Pay-per-View, mas nas compras de materiais do clube, especialmente camisas.
Em resumo, os problemas que temos em 2019 são consequência de anos de péssima gestão. O período de “vacas gordas”, tanto esportivamente quanto financeiramente, deveria ter permitido melhorias dentro e fora de campo. Ao contrário, quando as receitas estiveram em seu mais alto patamar, a direção optou por gastar mais e mais.
De 2013 a 2017, aprendemos que não dá para gastar de forma irresponsável porque a conta chega, sim. Mas os resultados de 2018 nos trouxeram um novo aprendizado: ter um time competitivo e avançar nas competições é INVESTIMENTO. Se não tem time forte, não tem dinheiro. Então, economizar nas operações é essencial, mas não dá para fazer economias burras no que é principal do clube, o futebol.