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Grande ou pequeno: a encruzilhada alvinegra.

 

Max Pereira
Do Fala Galo, em Belo Horizonte
19/04/2019 – 07

O Atlético acusou um déficit de R$ 21.850.588 na temporada 2018, a primeira de Sérgio Sette Câmara como presidente, segundo revelações do balanço do clube que será discutido pelos conselheiros no dia 29 de abril, na Sede de Lourdes.

A reunião servirá também para que o conselho conheça não só o parecer do conselho fiscal mas principalmente o resultado de uma auditoria independente contratada pela diretoria.

Os números apresentados nesse balanço são péssimos e escancaram que o Atlético está mergulhado em um buraco do qual vai demorar anos, talvez décadas para sair, isso se sair, caso o clube não sofra uma ação emergencial e radical.

Uma pergunta tem me atormentado: o que nos reserva essa auditoria e será que ela irá apontar números ainda piores que aqueles constantes do balanço do próprio clube, já bastante ruins e preocupantes?

Temo que sim, tendo em vista tudo aquilo que vem sendo sinalizado nos bastidores e até mesmo ventilado aqui e ali na grande imprensa e em espaços alvinegros de credibilidade como o Fala Galo.

Não raro, especialistas vêm se manifestando de forma bastante crítica sobre os balanços que vêm sendo apresentados e aprovados pelos conselheiros ano após ano, os quais, segundo eles, indicam que o clube vem se sujeitando a administrações temerárias quando o assunto são seus números e resultados financeiros.

Ao contrário do que vinha sendo alardeado em relação a um crescimento do número de sócios Galo na Veia na temporada passada, o balanço informa a queda da receita do programa, ou seja, decréscimo no número de participantes.

Também na contramão de uma informação recorrente há anos, segundo a qual o Atlético entra ano e sai ano é um dos três clubes que mais vendem “Pay-Per-View” no país, a receita de televisão também registrou queda significativa.

Aliás, não é de hoje que o Atlético vem registrando receitas de televisão que não refletem o seu potencial, já fartamente testado e comprovado no passado, no que se refere ao retorno publicitário que o clube tradicionalmente provoca nas transmissões televisivas abertas e fechadas.

Para quem duvida desse potencial, basta lembrar que a Rede Globo, detentora desde sempre dos direitos de transmissão da Super Liga de Futsal, apenas transmitiu os jogos decisivos e a grande final somente nas edições em que o Atlético não só participou mas também chegou às grandes finais dos torneios. Ou seja, com o Galo audiência e retorno garantidos.

Antes e depois do Atlético na Liga, mesmo com a participação dos chamados “times de bandeira”, como são denominados os grandes clubes do futebol brasileiro, a Globo nunca se interessou em transmitir um jogo sequer de futsal.

A Band, na época co-detentora dos direitos de transmissão por cessão da Globo, “coincidentemente” com a saída do Atlético da Liga, anunciou que não mais transmitiria o futsal.

A verdade é que o Atlético, tal qual um elefante, não sabe da força que tem e nunca a explorou.

O que já não era bom ficou ainda pior graças aos novos contratos com a televisão que impuseram a clubes como o Atlético, dependendo de alguns fatores, como por exemplo quantidade de jogos transmitidos nacionalmente pela TV aberta, ver a sua receita se distanciar dos números sempre crescentes, obtidos por outras agremiações, como Flamengo e Corinthians, bastante favorecidos.

Flamengo e Corinthians, donos das maiores torcidas do Brasil, ano após ano vêm recebendo tratamento diferenciado da televisão, o que se comprova pelo abismo que já surge entre suas receitas televisivas e a dos demais grandes clubes brasileiros. O Atlético hoje ocupa o terceiro escalão nesse ranking.

E não é só isso, dinheiro atrai dinheiro e a maior exposição televisa, aliada a uma política de marketing agressiva, faz com que o Urubu e o Timão também sejam detentores dos maiores contratos de patrocínio. A tendência natural, portanto, é que ambos passem a dominar o futebol brasileiro.
O alvinegro paulista ainda entrou em uma dívida gigantesca, resultante de um projeto muito mal feito para erguer a sua arena em Itaquera.

Tão grave quanto os maus desempenhos apontados acima, as receitas de marketing e de patrocínio também caíram, o que revela desvalorização da marca Atlético. Ou existiriam outros fatores que podem justificar essa retração de receita?

As quedas nas receitas do programa Galo na Veia e de bilheteria podem ser explicadas pela crise que atravessa o país, desemprego e emprego informal crescentes, falta de dinheiro e fatores afins.

As limitações do Horto, um estádio definitivamente acanhado para o tamanho da Massa, justificam em boa parte as dificuldades de expansão das receitas de bilheteria. Mas, a verdade é que existem outras variáveis a serem consideradas.

O futebol brasileiro vive uma farsa. Falido, mal administrado e em franca decadência moral e técnica.

Como isso, o futebol praticado dentro das quatro linhas é cada vez menos técnico, lúdico e vistoso, e cada vez mais físico, taticamente engessado e fortemente mental.

Muitos clubes, como o próprio Atlético fez muitas vezes, ainda insistem na prática de fazer dívidas e empurrá-las com a barriga.

Clubes tradicionais e de passado glorioso como Vasco, Fluminense, Botafogo e Santos também se contorcem em suas crises crônicas e, afundados por gestões temerárias, estão em franca decadência.

Alguns outros como São Paulo, Grêmio e Internacional, que já vivenciam há algum tempo uma administração profissional, ainda conseguem se equilibrar e, mesmo, sacudidos por efervescências políticas tradicionais, estes clubes ainda se mostram relativamente imunes aos graves problemas econômicos que estão assolando o país. Até quando não se sabe.

Já o Palmeiras vive momento e situação especiais, ao abrigo de um contrato milionário de patrocínio, o que lhe permitiu fazer jogo duro com a televisão, ao pleitear equiparação com Flamengo e Corinthians, o que até agora não conseguiu.

Se o alviverde paulista estiver se aproveitando da bonança financeira para se estruturar, coisa que não fez nos tempos da Parmalat, o clube do antigo Parque Antárctica se converterá de vez no carro chefe do futebol brasileiro. E isso com certeza preocupa a muitos e desagrada a certos poderosos do futebol tupiniquim.

Analistas já vêm vaticinando há algum tempo que, certamente a longo prazo e, talvez até mesmo a médio prazo, o futebol brasileiro tenderá a uma espécie de “espanholização”, com o rubro negro carioca e o Timão se tornando o Barcelona e o Real Madrid brasileiros e os demais clubes se apequenando em graus e proporções variados de acordo com suas capacidades de organização e planejamento.

O Palmeiras, alavancado pelo atual patrocinador, já se intromete decisivamente no andar de cima do futebol brasileiro e o que seria uma dupla de poderosos já se torna uma trinca bem diferenciada.

É nesse contexto hostil que o Atlético, mergulhado em problemas diversos, tem que buscar a sua redenção.

Sufocado por uma dívida que cresce consideravelmente, resultado de gestões amadoras, imobilizado por decisões que quase sempre concorrem para um estado de descontinuidade, refém de credores e quase sempre sacudido por convulsões políticas internas, o Atlético perde importância e respeitabilidade e vê diminuir, perigosa e drasticamente, sua capacidade de concorrer de igual para igual com seus co-irmãos, até então tão gigantes quanto ele.

Uma mudança de rumo, drástica e radical, se faz cada vez mais vital para o futuro do Atlético, única forma de deter esse processo de “apequenização” do clube.

No Atlético, pensar com os pés no chão e com responsabilidade quase sempre foi sinônimo de pensar pequeno.

O balanço referente ao exercício de 2018 aponta redução dos investimentos do futebol e evidencia uma confusão conceitual entre reduzir custos e despesas. Investimento não é despesa. Investimento, via de regra, traz retorno.

Ainda que o grave momento que o país atravessa e o enorme passivo acumulado pelo clube possam justificar a filosofia de austeridade vendida pela atual diretoria, é preciso dizer que o Atlético necessita urgentemente rever certos conceitos e, em especial, entender que ser austero não significa abrir mão da ousadia e da capacidade de investir.

Mesmo que no Atlético os investimentos não estejam trazendo o retorno esperado, não é necessário simplesmente reduzir ou eliminar tais investimentos, mesmo porque sem investir não haverá retorno possível. O certo é que se faça uma correção de rota e redirecione esses investimentos, buscando incrementá-los, diversificá-los e qualificá-los.

Ronaldinho Gaúcho, por exemplo, nunca foi um jogador barato, mas sua contratação, mesmo não tão bem conduzida como deveria, foi um investimento mais do que acertado e rentável. R10 trouxe títulos, receitas, qualificação da marca Atlético e projeção internacional.

Imagine quais seriam os resultados se o clube tivesse produzido um programa de marketing, trabalhando em conjunto às marcas Atlético e Ronaldinho Gaúcho?

R10 passou pela Cidade do Galo e o Atlético nunca trabalhou como deveria o potencial de marketing do astro. Todo o retorno que houve foi espontâneo, graças à imensa luz do gênio.

Reduzir a folha de pagamentos passou a ser obsessão de quem dirige o Atlético. Se as receitas são sempre insuficientes para as demandas e o clube ainda peca por falta de planejamento, é claro que o tamanho da folha de pagamentos torna-se um pesadelo. Mas os altos salários em si não são e nunca foram o calcanhar de Aquiles do clube.
Não é e nunca foi o que ganha este ou aquele jogador o maior problema do Atlético e sim a incapacidade do clube de viabilizar o retorno do investimento feito.

Sem poder dar retorno qualquer jogador, independente de nome ou salário, torna-se caro, muito caro.

Inúmeros são os casos de jogadores de ponta que brilharam em outros clubes no Brasil e no exterior, e até na Seleção Brasileira, e no Atlético não conseguiram dar o retorno esperado.

Renato Gaúcho, Evair, Neto, Valdeir, Luiz Carlos Winck, Zenon, Diego Souza, Djalma Dias, Jorge Campos, Gaúcho, são alguns exemplos de jogadores consagrados, que aqui não renderam nem uma pequena parte do que renderam em outros centros.

Vez ou outra dirigentes do Atlético sinalizam muita dificuldade em conseguir parceiros para viabilizar as contratações idealizadas.

Não é por acaso que vários investidores já se recusam a investir no Atlético. Ao verem jogadores colocados no clube em parceria com eles serem, diante de tantas falhas administrativas e da irracionalidade da massa, impiedosamente fritados, perdendo valor de mercado, o que representa graves prejuízos, é natural que estes investidores se tornem refratários a novos investimentos.

Apesar de o balanço registrar aumentos de receita nas vendas dos direitos econômicos de jogadores, é fácil perceber que o valor de mercado do elenco do Atlético, como apontam agências especializadas, vem caindo significativamente, o que vai comprometer os resultados de negócios futuros.

Soma-se a isso tudo o anti-marketing atleticano em curso nas mesas redondas de televisão, nos microfones das rádios e nas páginas dos jornais. A imprensa, cada vez mais desrespeitosa e debochada, contribui em muito para o enfraquecimento da marca do clube e para jogar ainda mais para baixo a auto-estima dos jogadores e dos torcedores.

Em sua primeira entrevista coletiva, o novo diretor de futebol mostrou estar antenado para isso, ao cobrar respeito dos meios de comunicação. A contratação de Rui Costa parece sinalizar que Sette Câmara tenha percebido o que é preciso mudar.

Mas só a chegada do novo dirigente não resolve nada. Como cacifar o respeito, como maximizar as receitas, como qualificar os investimentos, como romper com essa descontinuidade que vem engessando o clube, como blindar a instituição dos agentes externos nocivos e como imunizar a agremiação das eternas querelas internas e dos intermitentes rachas políticos que, como agora, abalam as estruturas do Glorioso e comprometem os resultados dentro e fora dos campos, são, em resumo, os grandes desafios do Atlético.

Grande ou pequeno: o futuro está em aberto. E só o Atlético poderá encontrar a forma e os meios para sair dessa encruzilhada, percorrendo o caminho que o seu gigantismo natural exige. Porém, sozinho o clube jamais se reerguerá. Depende de nós, torcedores, dirigentes e conselheiros, do que fizermos ou do que deixaremos de fazer daqui pra frente.

Juntos, misturados e fundidos nessa nessa paixão sem igual podemos tudo. Não é milagre, é Atlético Mineiro!

 

Revisado por: Jéssica Silva

 

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