Entre surtos e sustos
Imagem: Bruno Cantini/Atlético
Por Max Pereira (@pretono46871088 @MaxGuaramax2012)
De repente e, não mais que de repente, porém sem surpresa alguma, um novo surto de Covid explode no Atlético e tira o sono de seu torcedor. Ao mesmo tempo, as notícias sobre os casos de Covid no entorno da Copa América e no Brasil afora são cada vez menos animadoras. As horas que antecederam o jogo contra a Chapecoense foram de aflição, duvidas e questionamentos por parte da massa atleticana. A pergunta recorrente e que não queria calar era: “quantos e quem são os contaminados”?
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E, como desgraça pouca é bobagem, alguns perfis nas redes sociais começaram a soltar as suas “bombas” sobre a, até então, lista oficiosa dos contaminados. E, segundo, esses arautos do apocalipse Hulk também havia sido contaminado, “noticia” desmentida oficialmente pelo clube momentos antes do jogo. Houve quem enxergasse no silencio do clube e na falta de uma informação oficial durante todo o dia uma estratégia defensável do clube. Quem sabe, uma tentativa, ainda que inócua de tentar esconder do adversário os seus desfalques e problemas.
A verdade é que o Atlético, paradoxal por excelência, continua se contorcendo em seu cármico inferno astral. Time de massa e de uma massa explosiva e profundamente passional.
Confesso que, a exemplo de milhões e milhões de atleticanos, enquanto via a pífia apresentação do Atlético diante da modesta, porem briosa Chapecoense, fiquei muito irritado, xinguei bastante os jogadores, Cuca e a diretoria a mim mesmo, falei mal desse e daquele para mim e para as paredes, desejei que todos, literalmente todos, deixassem o meu Galo de uma vez por todas. Enfim, mergulhei no “Casillero del Diablo” e purguei todos os meus pecados.
Mas, entre surtos e sustos, tenho que buscar na racionalidade o equilíbrio e a condição de fazer a melhor critica possível e, assim, poder ajudar verdadeiramente o Glorioso a fazer jus a esta forma de ser chamado que o Monstro da bola, Toninho Cerezo, popularizou nos tempos em que vestiu o manto sagrado.
Fora das quatro linhas, as recentes parcerias e o continuo crescimento da receita do clube, com o interesse e a aproximação de gigantes como a Amazon, escancaram até para os mais céticos, que o Atlético está, de fato, mudando e mudando para melhor. E, antes que a massa pudesse assimilar integralmente a notícia da parceria com a Amazon, outra notícia alvissareira ecoa da sede da avenida Olegário Maciel. Existem interessados na aquisição dos Naming Rights da Cidade do Galo.
Uma inegável mudança de patamar que, como no não poderia ser diferente, vem acompanhada de percalços, parte absolutamente naturais e inerentes a qualquer processo de transformação e, parte, derivada de erros e de escolhas equivocadas que também acabam ocorrendo, seja porque as pessoas envolvidas, independentemente de status, posição, nível de poder e de decisão, são falíveis como qualquer ser humano, seja porque o clube ainda permanece muito susceptível ao extracampo e às ações de sempre dos inimigos de seu sucesso.
A quem, ao ler o parágrafo anterior, estiver imaginando que a intenção deste escriba é passar pano, tampar o sol com peneira ou defender a simples aceitação do erro de dirigentes, técnicos, comissão técnica e de jogadores, já vou logo dizendo que está redondamente enganado. Tapar o sol com a peneira seria, ao formular as minhas cobranças e as minhas críticas, tentar desprezar todas as variáveis envolvidas, em particular as questões de vestiário. Quem já foi piolho de vestiário e conviveu com vários e vários grupos de jogadores sabe da importância de um ambiente sadio e conhece os diversos fatores que podem leva-lo a se azedar.
Quem acompanha os meus escritos aqui neste espaço e no Blog Canto do Galo do companheiro, amigo e guru Eduardo Ávila, já percebeu a minha preocupação em oferecer não só um diagnóstico holístico e plural dos problemas do clube, como também, além de criticar o que eu considero equivocado e temerário na condução dos destinos da agremiação, sugerir caminhos e alternativas que posam contribuir efetivamente para que o Atlético cresça e se imunize de suas próprias idiossincrasias cada vez mais.
Aliás, nestes tempos pandêmicos falar em imunizar o Atlético é mais do que próprio e oportuno. E de quais seriam os vírus, além da Covid é claro, o Galo precisa ser protegido? Ou melhor, o que eu quero dizer quando falo que quero contribuir para que o Atlético se imunize de suas próprias idiossincrasias cada vez mais?
A resposta é simples: O Atlético, desde que me entendo por gente e passei a vivenciar a paixão pelo Glorioso de forma consciente e proativa, sempre mostrou uma indesejável e perigosa predisposição particular para reagir mal e temerariamente à influência de agentes exteriores, tal e qual determinados seres humanos reagem a medicamentos ou a certos alimentos. Ou seja, o Galo sempre exibiu uma característica comportamental peculiar diante de fatos ou de demandas que, normalmente, o deixam mais debilitado e exposto a crises e às ações externas daqueles que sempre agem a seu desfavor.
Por isso, neste ensaio vou focar especificamente uma questão que, a meu ver, vem sendo, ingênua e perigosamente, negligenciado: o extracampo. Isso não significa que os outros aspectos e fatores que estão na raiz da irregularidade do time dentro de campo e de alguns maus resultados devam ser relevados ou, tampouco, minimizados.
Aqui faço algumas perguntas: por que não se indignar com os erros da arbitragem e do VAR quase sempre a desfavor do Atlético e com a venal omissão de quem deveria coibir a violência contra Hulk? Por que muitos consideram que questionar e protestar contra erros de arbitragem e do VAR que recorrentemente têm trazido prejuízos irrecuperáveis ao clube como perdas de título, de prestigio, de respeito e de dinheiro, significa passar pano na cabeça dos jogadores, significa não reconhecer que o time tenha jogado mal, que o técnico do momento tenha errado na escalação ou nas substituições? Por que não reconhecer ou não entender que jogar mal e erros da arbitragem são coisas excludentes? Ou seja, por que não entender que não é porque um time jogou mal e até tenha merecido perder a partida que o arbitro e o VAR estão automaticamente autorizados a prejudica-lo?
Gente, quem cala, consente. Dizem que mulher de malandro gosta de apanhar. Repudio veementemente este papel.
Há uma razão histórica para tudo isso. A massa atleticana sempre foi desestimulada de fazer críticas e cobranças em relação às arbitragens. “Ah! O time joga mal e você quer jogar a responsabilidade nas costas dos árbitros? ” Quantas vezes escutei essa pergunta capciosa e outras tantas expressões não menos enganosas e covardes como, por exemplo, “Ih! Lá vem você com esse chororô! ”, “O choro é livre e a cama é lugar quente”.
Reconheço que a repressão à indignação e à cobrança em relação aos erros de arbitragem é imensa, asfixiante, coercitiva e poderosa. Mas, se aqui e ali, o atleticano começar a levantar a sua voz contra isso e contra outros ataques alienígenas, fatalmente o comando atleticano se estimulará a sair deste torpor de décadas e também a buscar se impor e a fazer prevalecer os lídimos interesses desse alvinegro, gigante e famoso, porém muito maltratado e quase sempre derrotado por goleada no jogo pesado dos bastidores.
Em uma das últimas coletivas de Cuca, o companheiro Betinho do Fala Galo, de forma diligente e bastante oportuna, questionou o treinador atleticano sobre a passividade do clube que, em razão dos sucessivos desfalques provocados pelas seguidas convocações de seus jogadores, ao contrário de outras equipes como o Flamengo, em momento algum se movimentou para pleitear que os seus jogos fossem remanejados.
Cuca respondeu protocolarmente. Mas, o que importa, é que a pergunta formulada pelo Betinho não só mostra o seu incomodo, mas, certamente reflete o descontentamento de vários outros torcedores em relação a essa passividade recorrente do comando atleticano nestas questões de bastidores.
Para ficar em poucos exemplos, lembro-me de julgamentos extemporâneos e casuisticamente marcados e levados a efeito para privar o Atlético de um jogador importante em um jogo decisivo como aconteceu no Brasileirão de 77 com o Rei Reinaldo que ficou de fora da decisão contra o São Paulo. E o resultado todos sabem. Lembro, também, da transferência da decisão entre Atlético e Flamengo pela Libertadores de 1981 para o Serra Dourada quando, pelo regulamento da competição na época, o jogo deveria ter sido disputado no Mineirão. O que aconteceu naquele fatídico espetáculo é do conhecimento de todos e o Atlético foi punido pela sua inapetência e inoperância.
Aliás, em recente documentário inglês o jogo do Serra Dourada é apontado como uma farsa, corroborando a opinião de vários analistas internacionais que apontam aquele confronto como o maior escândalo do futebol mundial de todos os tempos.
Mas, chega de chororô. Mesmo porque de nada adianta reclamar depois que o leite estiver derramado. E chega de jogar para a torcida.
Entre surtos e sustos, alimentemos nossa capacidade de nos indignar, levantemos as nossas vozes, exijamos respeito e cobremos energicamente do comando atleticano que passe agir nos bastidores proporcionalmente ao atlético que eles próprios se ufanam de dizer que estão construindo.