Entre o mecenato e o investimento

Foto: Reprodução Internet 

 

Prof Denílson Rocha
25/07/2020 – 09:12
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Nas últimas semanas, o Atlético passou a ser assunto frequente nos programas esportivos nacionais. Enquanto os profissionais mineiros se esforçam para passar informações adequadas (mesmo com críticas) dos clubes locais, comentaristas que mal lembravam da existência dos times fora do eixo RJ-SP resolveram colocar os investimentos do Galo na pauta diária. A abordagem tradicional trata dos muitos milhões em compras durante a pandemia, do alto salário do técnico Sampaoli, da construção da Arena MRV e do “mecenas” Rubens Menin. Rafael, Mailton, Bueno, Alonso, Arana, Allan, Alan Franco, Tardeli, Savarino, Keno, Marrony… os nomes ou as características dos atletas pouco importam – só vale dizer que o destino é o mesmo do rival local.

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A constatação da absoluta desqualificação nas abordagens começa com a ignorância quanto às condições para construção da Arena MRV. O projeto apresentado em 2017 e aprovado pelo Conselho Deliberativo do Atlético é público e amplamente conhecido. Mais que isso, o FalaGalo tem inúmeras publicações sobre a Arena MRV, com detalhes que nunca foram apresentados nas reformas dos estádios para Copa ou para as novas arenas de diversos clubes Brasil afora. Se houve críticas quanto ao dinheiro púbico investido na construção da Arena Itaquera, nunca foram tão veementes e contundentes quanto as que agora aparecem para o estádio atleticano. Em programa recente, um dos comentaristas cita o Allianz Parque como referência, mas deixa de abordar os frequentes conflitos entre o Palmeiras e a WTorre, “parceira” na construção. A gestão compartilhada ou mesmo as dívidas que Palmeiras, Athlético ou Grêmio possuem são ignoradas. Enquanto isso, um estádio cujo planejamento descreve a origem dos recursos para a construção e não gera endividamento é tratado como “loucura” ou “aventura”.

Mas o mais interessante é o quanto o “mecenas” Rubens Menin vem sendo questionado – mesmo que o investidor já tenha comparecido a inúmeros programas para falar dos recursos, dos juros ou taxas a serem aplicados e do período para devolução de seus valores. Para os que ainda não compreenderam, são empréstimos, sem incidência de juros e sem prazo para devolução. Basta rever qualquer entrevista concedida pelo empresário. Por sinal, em tais entrevistas, as críticas desapareciam e o ninguém teve a audácia de questionar o empresário de sucesso quanto a estar fazendo loucura em um clube de futebol.

Nem deveriam chamar de mecenato. Afinal, “mecenas” vem do nome de Gaius Maecenas, conselheiro do imperador romano Augusto, que foi patrocinador e protetor de artistas. Futebol já não é “arte” há muito tempo. É negócio que movimenta bilhões. E os aportes de valores no Atlético são empréstimos, formalizados e descritos, inclusive, nas demonstrações contábeis. Ou seja, não tem nada de mecenato.

E nem é isso que impressiona…

Os parceiros no futebol não são novidade. Me lembro dos anos 1980, com “bicheiro” Castor de Andrade, tido com um dos mais ricos do Brasil, e financiador do Bangu. Com a “modernização” do futebol, vieram Parmalat, MSI, Koch e diversas outras instituições que colocaram dinheiro em clubes de futebol. Junto a alguns títulos, vieram a corrupção e os negócios lesivos. Ao saírem, deixaram muitos clubes em dificuldade, inclusive o Atlético.

A gestão Paulo Nobre, no Palmeiras, é usada como principal comparação com a atual situação do Atlético. Com o clube endividado e em crise esportiva e financeira, o então presidente do clube realizou operação financeira que permitiu equacionar dívidas, estruturar administrativamente e recuperar esportivamente o Palmeiras. Falando de maneira bastante simples, Paulo Nobre “comprou” a dívida e financiou a longo prazo. O que é muito diferente do que vem acontecendo por aqui.

Mas há outros investimentos com características bem menos “nobres” (com o perdão do trocadilho) e que não recebem os mesmos questionamentos dos renomados comentaristas esportivos. Serve o exemplo do mesmo Palmeiras, cujos patrocínios estiveram fora da realidade do mercado e a compra de atletas foi alvo de ação da Receita Federal, que transformou as “doações” em empréstimos. A “tia” recebeu algumas poucas críticas nos programas esportivos. Ao contrário, jamais teve qualquer pergunta mais incisiva ou direta quanto aos empréstimos ou, mais importante, quando à forma como foi alçada à condição de conselheira. Em suas entrevistas nos debates esportivos, a investidora sempre é admirada e elogiada. As críticas desaparecem.

Também não se vê muitos questionamentos quanto ao patrocínio concedido ao atual campeão brasileiro. Não bastasse o histórico financiamento recebido pela estatal de combustíveis, atualmente passou a estampar a marca de um microscópico e pouco significativo banco público da capital federal. Banco este, presidido por um declarado torcedor da equipe, com interesses bastante claros na política partidária do estado do Rio de Janeiro. O patrocínio foi questionado pelos órgãos de fiscalização – o que não deve dar em nada –, mas quase ninguém da mídia esportiva deu atenção ao fato.

Voltemos ao Atlético, então…

Os atuais apoiadores do Galo são conselheiros do Clube há muitos anos – não foram colocados na posição em manobras criativas. Mais que isso, sua participação na vida do Atlético não começou em 2020. Estão presentes há muito tempo, seja como patrocinadores, por meio de suas empresas, seja com empréstimos pessoais ou doações (não apenas do terreno para Arena MRV, mas também para construção da Cidade do Galo). Oferecem apoio, como patrocinadores, a diversos outros clubes brasileiros, sendo tradicionais apoiadores do esporte nacional.

Como os cronistas estão distantes da realidade mineira e se mostram tão preocupados com o caminho que o Atlético vem trilhando, como a tanto receio do Galo seguir o caminho do rival, vamos ao mais importante:

– a Arena MRV não aumentará as dívidas do Atlético. Ao contrário, permitirá que o Clube amplie consideravelmente suas receitas de matchday, como aconteceu com Grêmio, Inter e Palmeiras, por exemplo.

– as dívidas do Atlético são, em sua imensa maioria, com o PROFUT e com os atuais apoiadores. Ou seja, há equacionamento. Os atuais aportes para contratação de atletas devem, sim, aumentar a dívida. Porém, o perfil das contratações deixa bastante claro que há um investimento em jovens com potencial de retorno esportivo e financeiro. Algo bem diferente dos medalhões com salários estratosféricos no rival.

– não há qualquer sinal de gestão temerária na atual administração Atleticana. Ao contrário, empresas de referência em seu setor de atuação estão participando da reorganização do Clube.

Já usamos esse espaço para muitas críticas à gestão Sette Câmara. Continuamos com muitos questionamentos, especialmente quanto à transparência e iniciativas para relacionamento com a torcida e aumento das receitas do clube. Continuamos críticos e esperando que o Atlético tenha uma gestão profissional e competente para garantir o equilíbrio financeiro e, tão importante quanto, manter o Galo entre os principais e mais vencedores clubes do Brasil.

Que o presidente Sette Câmara tenha a clareza que a confiança depositada no trabalho está vinculada à imagem do conselheiro Rubens Menin. Mais que o dinheiro aportado no Atlético, o apoiador “colocou a cara”, esteve diante de jornalistas e do público para esclarecer suas iniciativas no Galo e mostrar sua crença quanto ao caminho trilhado. Um empresário de tamanho sucesso não colocaria sua credibilidade à prova em uma aventura.

Não é suficiente?

Nos últimos anos, muitos torcedores passaram a ter consciência do quanto é salutar conhecer a gestão do clube e cobrar pela profissionalização. O exemplo do rival ampliou tal atenção. Então, a Massa Atleticana não está passivamente observando o clube trilhar o mesmo caminho. Há incentivo, mas também há atenção, crítica e questionamento.

O Atlético não precisa de mecenas, caridade ou esmolas. Precisa de gestão profissional e qualificada. Precisa de investimentos, como qualquer negócio. Este é o caminho a ser trilhado. Esta é a reconstrução do Galo.