Foto: Flickr Atlético / Pedro Souza
Por Max Pereira (@pretono46871088 @MaxGuaramax2012)
Para muitos, este duelo entre Atlético e River Plate pelas quartas de finais da Libertadores 2021 parece ser uma final antecipada da competição. Pelo menos é sem dúvida nenhuma o encontro mais badalado desta fase do torneio mais importante do continente sul-americano, não obstante nesta mesma chave dois gigantes brasileiros, Palmeiras e São Paulo, também medirem forças. E quiseram os deuses do futebol que os vencedores destes dois jogos se enfrentem em uma semifinal que também promete polarizar as atenções e ser tão elétrica tanto quanto esta briga de Atléticos centenários e históricos.
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Muitos não sabem, mas, o adversário do Galo nestas quartas de finais da Libertadores também é Atlético. O Club Atlético River Plate, simplesmente chamado de River Plate, fundado no dia 25 de maio de 1901 e treinado pelo emblemático Marcelo Gallardo, é quem vai receber o Glorioso das Gerais que volta ao Estádio Monumental de Núñez 43 anos depois de seu último jogo naquele templo do futebol. Galo x El Millonario é um confronto que, por certo, promete fortes emoções.
Sobre os gênios cuja magia encanta tantos quantos têm ou tiveram o privilégio e o prazer de desfrutar de seu talento muitos dizem que eles já nascem fadados a brilhar, que já nasceram dotados da graça divina. Pelé e Reinaldo foram chamados de reis e adorados por uma legião de súditos, Garrincha, para uns era o Anjo das Pernas Tortas, para outros o demônio que calçou chuteiras, Ronaldinho Gaúcho, para outros tantos, se tornou o Bruxo e Maradona, um deus que desceu aos gramados da terra para mostrar que o impossível era possível. E parece que eles, de fato, já nasceram diferentes, não é mesmo? Mas, um time de futebol também já nasce campeão?
Para mim e muitos outros, como o Professor Celso Unzelte, comentarista dos canais Disney, ESPN e Fox Sports, não. Ao enaltecer a suada vitória do Atlético sobre o Juventude em Caxias, Unzelte disse que foi um jogo para temperar caráter de campeão. Para o nobre analista o Galo teve mérito porque se modificou durante o jogo e, até o final da partida, buscou o resultado que lhe interessava. Para mim, o Atlético vive um momento de transformação e, como não poderia ser diferente, sofrido e de superação. Explico:
No artigo “O ATLÉTICO DE CUCA”, publicado nesta coluna em 5 de agosto passado, escrevi que “não raras vezes o Atlético me faz lembrar de Dom Quixote de La Mancha de Miguel de Cervantes, aquele mítico e alucinado cavaleiro da idade Média que, no afã de defender e salvar a sua amada, investia e lutava contra dragões imaginários que, na realidade eram apenas simples moinhos de vento”.
E esses últimos jogos do Atlético têm me trazido com uma frequência assustadora a lembrança do conturbado herói de Cervantes. É cada vez mais forte a sensação de que os jogadores do Atlético, além de lutar contra os briosos adversários sempre motivados para impor mil e uma dificuldades ao Glorioso, também se batem contra rivais imaginários para nós, mas tão reais para eles quanto os dragões combatidos por Dom Quixote.
Quem me acompanha em minhas redes sociais e/ou lê os meus artigos sabe que eu, de há muito, defendo a tese de que o Atlético é e sempre foi o seu principal e mais duro adversário. E, também, sempre defendi que o dia em que o Atlético conseguir derrotar a si próprio ele derrotará a qualquer outro adversário. E este Atlético que buscou a vitória contra o Juventude pareceu-me ser aquele Galo que está aprendendo a lutar contra si próprio e, principalmente, a derrotar-se e a espantar os seus fantasmas.
Um time com caráter de campeão não se forma da noite para o dia. Ainda que tenha em suas fileiras um gênio ou um bruxo como R10, a exemplo do que ocorreu em um passado recente, um time para ser campeão tem que ser cozido, tem que sofrer, que se superar e exorcizar os seus demônios. Foi assim em 1971, foi assim no biênio 2013/2014.
No artigo “É GOOOLLLLLL! O MEU TIME É A ALEGRIA DA CIDADE! ”, publicado em 6 de agosto passado no Blog O CANTO DO GALO, escrevi que, “assim, como em 1971 Dadá tinha a “solucionática” e no biênio 2013/2014, a magia de R10 foi o alimento dos gols de Jô e Cia. Ltda. e Victor virou santo, algo me diz que, de uma forma ou de outra, o Atlético continuará levando a bola para o fundo das redes adversárias. Afinal, além de ter em suas fileiras um super-herói, o professor na jornada dos anos 2013 e o de hoje são a mesma pessoa. Se eu acreditei antes, por que não agora, não é mesmo? ”
Misticismo à parte, porém, o importante é perceber que o treinador também está passando por este processo de maturação, de formação de um caráter de campeão. Por isso, entendo que este jogo contra La Banda ou El Más Grande, como carinhosamente o River é chamado pela sua apaixonada “hincha”, será uma etapa fundamental ao cozimento de um Atlético campeão, como já pressente Celso Unzelte. E, qualquer que seja o desfecho final deste duelo, nenhum dos dois times passará impune por ele.
Sempre administrando o meu otimismo e, sem jamais podá-lo, vejo com boa expectativa as possibilidades de sucesso do Atlético nesse confronto contra o Gigante argentino, principalmente por entender e acreditar que, em razão do que vem acontecendo com o time atleticano nos últimos jogos, Cuca já deve ter percebido o quão é importante o equilíbrio entre os setores da equipe e o quão é fundamental trabalhar o aspecto mental dos jogadores.
Aliás, o próprio treinador, ao admitir publicamente que o time ainda não chegou ao ideal e que pode render muito mais do que está rendendo, revela o que para muitos já era claro e inescondível: o enorme desgaste do time atleticano. Controvérsias e opiniões diferentes à parte, entendo que, tanto quanto os desequilíbrios físicos, o desgaste mental de vários jogadores é mais que evidente.
A notícia de que o elenco que seguiu para a Argentina foi encorpado pelas voltas de Zaracho, Vargas e Arana, indica que Cuca terá meios e opções de lançar um time mais equilibrado física e taticamente e, em consequência, mais eficiente.
Toda e qualquer jornada nessa vida louca e fascinante tende a ser naturalmente tortuosa, prenhe de armadilhas, de obstáculos e de muitas e muitas dificuldades, oferece mil e um caminhos e, portanto, impõe mil e uma escolhas. E, no futebol, não é diferente.
E são exatamente as más escolhas e os erros, seja na preparação e escalação do time, sejam aqueles que, por qualquer razão, acabam ocorrendo durante os jogos, as maiores e melhores fontes de aprendizado e crescimento.
Nestes tempos pandêmicos e sufocado por um calendário perverso, o Atlético se viu mutilado por contusões, convocações em excesso e um malfadado surto de Covid. E entre tempestades e trovoadas, ora acertando, ora errando, o Glorioso sobreviveu a todas as intempéries que se interpuseram em seu caminho e permanece vivo e potencialmente candidato ao título em todas as competições que está disputando. Unzelte tem razão. Jogo a jogo um Galo campeão parece estar surgindo no horizonte. Jogo a jogo o caráter de campeão vai sendo temperado.
Mas, atenção: não estranhem se novos tropeços e alguns sustos voltarem a acontecer. Faz parte do processo de cozimento. E, como qualquer outro processo, ele tem que ser trabalhado e ajustado, dia sim, o outro também, de modo dar ao Atlético elementos e condições para saber se levantar, melhor, superar as adversidades e, principalmente, as suas próprias idiossincrasias. É tempo de temperar caráter de campeão.
Em 1971, o time atleticano correu por fora, como quem não queria nada e, quando os chamados favoritos se assustaram, beliscou o título. Em 2013, a massa acreditou e se somou à magia de R10 e aos milagres de São Victor. Agora, é tempo de temperar o caráter de campeão. É tempo de o time, mais que acreditar, se moldar para fazer acontecer.