Foto: Pedro Souza / Atlético
Por Max Pereira (@pretono46871088 @MaxGuaramax2012)
Bem próxima de abrir, a nova janela internacional de transferências promete sacudir o futebol brasileiro e desafiar a argúcia dos treinadores que por aqui atuam. Alguns clubes como o Atlético correm um risco enorme de verem seus elencos desfigurados, desafiando seus comandantes, dependendo do que acontecer, a reconstruir um time praticamente do zero. Menos mal, embora ainda preocupante e complexa, se a tarefa se resumir tão somente a adaptar e a entrosar um ou outro reforço pontual, contratados a título de reposição das peças que saíram.
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Nestes tempos pandêmicos o que não falta são polêmicas. A última delas e que pode influir decisivamente no que vai acontecer daqui pra frente no futebol brasileiro é a controversa e, até agora, indefinida realização da Copa América no Brasil. Aliás, o STF vai julgar exatamente nesta quinta-feira uma ação que pede a suspensão do torneio em território nacional em razão da pandemia e dos riscos de aceleração de uma nova onda de proporções incalculáveis.
Sempre achei que política e futebol são irmãos siameses e muitos são os exemplos que mostram, um e outro, interligados e se servindo mutuamente. E, como acontece quando o assunto é política, no futebol as opiniões e reações são extremadas, polarizadas e, muitas vezes, irracionais.
Nestes tempos pandêmicos, a realização de qualquer evento, independentemente de sua natureza, em um país com as características e problemas do Brasil, é algo sempre temerário e carece de profunda reflexão. O certo é que, ainda que a Copa América fosse cancelada ou, pelo menos, adiada “sine die”, ainda teríamos uma overdose de competições e eventos que, de “per si”, já acarretam preocupações e cuidados extraordinários. No futebol, então….
Continuamente contestados, seja em função da idade ou de um momento de baixa na carreira, seja em razão de sua origem e nacionalidade, os treinadores brasileiros têm diante de si uma tarefa hercúlea: encontrar o equilíbrio e a eficiência em meio a tantos problemas e situações que, muitas vezes, fogem ao seu controle. No Atlético não é diferente e Cuca, apoiado por muitos e repudiado por outros tantos, já se contorce para escalar o melhor time nessa sequência insana de jogos e de viagens de logística complicada que o Galo está sendo obrigado a enfrentar sem poder contar com 8 (oito) jogadores que estão servindo às suas seleções e ainda sem Keno, lesionado, Jair, fora de fora e sem ritmo e Tardelli que deixou o clube.
E, se nessa próxima janela internacional de transferências, algumas das sondagens que o Atlético vem recebendo se transformarem em propostas concretas e irrecusáveis como sonha o clube e não esconde, resultando em saídas de jogadores importantes, o desafio que será imposto a Cuca pode ser impossível de ser enfrentado e, principalmente, de ser vencido.
Para muitos observadores, os treinadores jovens estariam à frente dos mais antigos no enfrentamento desses problemas e muito mais aptos para conviver as evoluções táticas que o futebol de hoje impõe. É que, segundo esses analistas, a vaidade dos técnicos antigos não lhes permite rever os seus conceitos e, nem ao menos, conhecer e experimentar novas concepções táticas. Haveria nisso tudo um medo do novo que a psicologia pode explicar.
E, quando o fazem, fazem com algum “delay” e, claro, com imperfeições muitas vezes incontornáveis, graças às suas idiossincrasias cultivadas anos e anos e ao apego a concepções já deterioradas, sentenciam os críticos dos técnicos mais rodados, para os quais os novos treinadores, livres das amarras de conceitos internalizados ao longo dos tempos e, portanto, difíceis de serem reformulados ou ao menos adaptados às exigências dos tempos atuais, se mostram, por óbvio, muito mais abertos a novas ideias e experimentos.
Outro grupo de analistas enxerga uma defasagem dos técnicos brasileiros em relação aos treinadores estrangeiros, entendendo que os primeiros, com raríssimas e cada vez menos exceções, estão irremediavelmente superados. O curioso é que, de certa forma, os técnicos estrangeiros, salvo o português Jorge Jesus, têm tido imensa dificuldade de desenvolver o seu trabalho e de aplicar os seus métodos e conceitos.
Na realidade sejam novos, sejam antigos, sejam brasileiros, sejam estrangeiros, o certo é que todo e qualquer treinador vai ter sempre problemas e irão enfrentar obstáculos variados e pesados para desenvolver o seu trabalho. O desafio de todo e qualquer treinador tende a ser cada vez mais complexo.
Em sua entrevista coletiva logo após se tornar o técnico mais vitorioso do campeonato paulista e, mesmo não tendo o seu time praticado um futebol vistoso e convincente, Vanderlei Luxemburgo defendeu o cuidado e a proteção da essência do futebol, brasileiro que, conforme lembrou, venceu cinco copas do mundo de seleções e onze mundiais interclubes sem, segundo ele, a presença e a influência do treinador estrangeiro. E questionou: por que mudar, então?
Luxa esqueceu-se, porém, de treinadores estrangeiros como, por exemplo, Dom Fleitas Soliche, Dom Ricardo Diaz, e Dom Filpo Nunes (Nunhes, com til no “e”) que trabalharam em vários clubes brasileiros no passado com absoluto sucesso e sem esse grau de rejeição que hoje se verifica no seio de seus pares brasileiros. Os dois primeiros, para quem não sabe, tiveram passagens significativas pelo Atlético e fazem parte da história do clube.
Assim como acontece com os jogadores estrangeiros, estes treinadores aqui vieram, deixaram uma imensa contribuição para o futebol brasileiro e jamais deixaram de respeitar e/ou puseram em risco a essência do futebol brasileiro. Além de conteúdos táticos diferentes e uma nova forma de ver o futebol, atletas e técnicos, vindos de outros países, quebram paradigmas e tiram os brasileiros de suas zonas de conforto. E isso é muito bom.
Mas, em uma coisa concordo com o “Profexô”. É essencial cuidar para não conspurcar com a essência do futebol brasileiro, ou seja, com aquilo que faz o jogador brasileiro ser diferente de qualquer outro deste planeta.
Mas, não é só os treinadores que estão sendo desafiados. Os dirigentes também. Assim, tudo o que acontecer daqui pra frente com o Atlético vai escancarar, para o bem ou para o mal, a qualidade do planejamento e da condução do futebol atleticano.
Ou seja, mais do que nunca, além de modernizar e democratizar o clube, cuidar da marca da instituição e provê-lo de uma gestão profissional, tornando-o apto a vencer também as batalhas dos bastidores, hoje é fundamental a um gestor de grupo, saber planejar e estruturar o futebol e enxergar o elenco como um grupo heterogêneo de seres humanos que também oscilam e alternam seus humores, suas entregas e seus momentos, de acordo com as suas próprias idiossincrasias.
Assim, é essencial a presença de alguém de peso, experiente, junto à comissão técnica, que tenha voz e comando, que dê ao treinador a sustentabilidade necessária e, quando preciso, o blinde, para que este execute o seu trabalho em nível de excelência, administre o grupo podando possíveis crises relacionadas a insatisfações pontuais, a dificuldades naturais de adaptação aos métodos e conceitos do treinador do momento e à variação de humores, próprias de qualquer ser humano.
Se é absolutamente importante dar a qualquer treinador condições e estrutura para desenvolver o seu trabalho e é vital também que o gestor do futebol saiba também administrar a geniosidade do técnico de plantão. Em outros escritos já venho defendendo a presença e a ação de um profissional desse naipe no futebol atleticano. O Atlético, a meu ver, tem deixado muito solitários e sem referência, os jovens treinadores a quem, ao longo dos últimos tempos, o clube confiou o comando do time. Thiago Larghi, Rodrigo Santana e Roger Machado são exemplos clássicos de trabalhos promissores mal sustentados pelo clube.
Sem querer ser saudosista, não posso deixar de lembrar que os diretores de futebol de antanho, diferente dos de hoje, falavam “futebolês” e entendiam profundamente dos meandros do futebol e de sua organização tática. E um detalhe importante: não existiam as figuras dos empresários e dos agentes do futebol, gente que mudou para sempre as relações interpessoais entre jogadores e clubes, os negócios e o mundo do futebol.
Confesso ter saudades daquela época romântica do futebol, onde a técnica e a qualidade eram predicados naturais e indispensáveis e as preocupações defensivas não eram obsessivas. Atacar e ser feliz era a regra de ouro. Se hipoteticamente tirarmos dois retratos, dois instantâneos, um daquela época e outro dos tempos atuais, muita gente vai dizer que se tratam de esportes diferentes.
Muita água passou por baixo da ponte e o futebol sofreu profundas transformações, dentro e fora dos campos, na forma de jogar e de gerir futebol, no perfil dos dirigentes, dos treinadores e dos jogadores. E também na relação dos clubes com as suas torcidas.
E uma das transformações que não pode e nem deve ser desconsiderada se deu no ambiente interno dos clubes, onde se misturam jogadores diferentes, de origens diversas, que professam religiões diferentes e que possuem alta rotatividade, o que impede a muitos de cristalizarem alguma identidade com os clubes por onde passam. Alguns são verdadeiros nômades.
Todas essas variáveis estão interpostas e, claro, interferem decisivamente no desempenho do time e no trabalho dos treinadores, tornando mais e mais desafiadora e complexa essa batalha do dia a dia em busca de um bom futebol. Assim, os treinadores de hoje e Cuca, em particular, estão diante do maior desafio de suas histórias. Maior porque atual, maior porque fundamental, maior por que levará eles e o clube que dirigem ao SUCESSO OU AO FRACASSO, À GLORIA OU À HUMILHAÇÃO. Assim, não basta apostar no sucesso, é preciso construí-lo.
Se para uns o importante é vencer independentemente do futebol praticado, ainda é visível e forte o clamor daqueles que ainda não desistiram do futebol bem jogado e bom de assistir. E esse apelo vai se tornando um aliado poderoso de todo aquele treinador que acreditar que é capaz de fazer o plástico e o lúdico derrotarem o mau futebol.
Nem a nacionalidade e nem a idade do treinador, nem a sua experiência e o que fez ou deixou de fazer no passado, e, nem tampouco o time que ele montar são garantia do sucesso, se não houver planejamento, trabalho e gestão de grupo eficiente.
E, se não bastassem todas essas variáveis, há que se considerar que todos esses problemas gerados pela superposição de competições, pelos desfalques provocados pelas sucessivas convocações, pelas saídas iminentes e pelos percalços trazidos pela pandemia, podem ser fatais para vários clubes e, em especial, para o Atlético, como aconteceu com o próprio clube durante a última Copa do Mundo. Se lá, o comando atleticano promoveu um desmanche, saindo à cata de recursos financeiros de forma temerária e sem planejamento, agora, dependendo do que for feito e planejado, o Atlético pode novamente colocar tudo a perder.
Por isso, não basta apostar no sucesso, é preciso construí-lo.