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Coluna Preto no Branco: Nada como um dia após o outro…

Por Max Pereira, colaborador independente, de Belo Horizonte

Até o jogo contra a Caldense pela última rodada da fase inicial do campeonato mineiro 2022 muito se tinha perguntado aqui e ali se algum dia veríamos o time atleticano jogando e encantando à sua torcida e a todos os amantes do futebol à feição e ao modo de jogar de Antônio Mohamed.

Se não foi brilhante, a partida jogada pelo Atlético diante da Veterana, menos pelo placar de 3 x 0 e mais pelas variantes táticas, pelo jogo coletivo e pela dinamicidade que a marcaram durante os 90 minutos, deu uma resposta satisfatória a esta pergunta que vinha povoando o imaginário atleticano e, confesso, inquietando o torcedor galista que, como eu, é naturalmente sempre impaciente e frenético.

Precavido e experiente, “El Turco” em sua entrevista coletiva, ao mesmo tempo em que mais uma vez deixou clara e comemorou a importância do que vem chamando em bom espanhol de plantel “largo”, ou seja, elenco forte em opções e em qualidade, fez questão de ressaltar que no Atlético não existem apenas 11 titulares.

E, ao dizer que, em função disso é seu objetivo utilizar todo o elenco que tem à sua disposição, variando o jogo taticamente e buscando confundir os seus adversários, o treinador alvinegro ratificou a impressão quase unânime no seio da Massa de que, daqui prá frente, o time de Mohamed não será apenas um Atlético forte, fluido, dinâmico, insinuante e propositivo, mas, ao contrário, serão muitos Atléticos envolventes e ofensivos que se alternarão em campo não apenas de um jogo para outro, mas também e, principalmente, na mesma partida e diante do mesmo adversário.

Mas, nada como um dia após o outro. Assim como a vida, o futebol também é presa das armadilhas, dos incidentes, dos imprevistos, das surpresas, dos erros e das escolhas equivocadas que muitas vezes deixam em xeque o planejamento ou revelam a falta deste e impõem desafios a quem tem por missão gerir esporte em todos o níveis da estrutura de um clube.

A recidiva lesão muscular de Mariano e a concomitante suspensão de Guga levaram o Turco a improvisar Nathan Silva na lateral direita o que, como não podia ser diferente, deve ter dado o que pensar e preocupar intramuros do clube. Se de um lado a escalação do zagueiro Nathan Silva na lateral direita valeu como experimento e objeto de análise, de outro revelou que o sub-20 atleticano, à luz do entendimento de quem conduz o futebol, profissional do Atlético, não possui ninguém apto e suficientemente maduro e preparado para ocupar aquela posição e para exercer as funções táticas decorrentes.

A grave lesão de Dodô é mais um alerta que não pode e nem deve ser desprezado pelos dirigentes atleticanos e, claro, pelo próprio treinador. Com a convocação de Arana para a seleção brasileira, o problema se repete na lateral esquerda. Curiosamente, e não sem razão, as especulações sobre as soluções que serão empregadas por Mohamed giram tão somente em torno das improvisações ou de Allan ou de Calebe ou ainda de Tchê Tchê naquela função, todas elas válidas sob o ponto de vista da experimentação e da avaliação.

A contratação do lateral direito Sandro, ex-Santos, concretizada e anunciada nos últimos dias parece ser uma resposta antecipada da diretoria do Atlético a um problema que poderia se agravar nessa posição, caso as lesões musculares de Mariano, um jogador de 35 anos, continuem se repetindo e Guga seja negociado na próxima janela, hipótese nunca descartada pelo comando alvinegro.

Sem surpresa alguma, as redes sociais e até alguns segmentos da mídia convencional sacaram inúmeras críticas ao trabalho de base no Atlético. Ainda que curiosamente muitos dos críticos do trabalho realizado pelo clube em suas categorias de base falem mais por achismo e por vontade meter o pau vez que não acompanham em profundidade nada do que é feito lá e sequer conseguem assistir mais do que um ou dois jogos por temporada, o que é muito pouco para alicerçar qualquer tipo de avaliação, é preciso reconhecer que, embora o comando atleticano venha se mostrando preocupado em estruturar, modernizar e qualificar a base alvinegra, esta tem passado por preocupantes processos de descontinuidade.

Além disso, a inexistência de um projeto consistente de transição é outro complicador. Muitos garotos da base ao “estourarem” a idade são precipitadamente negociados, empestados ou vendidos, ou ainda temerariamente dispensados e, vários dentre eles, passam, por fim, a engrossar as fileiras dos chamados nômades do futebol. Uns poucos permanecem no clube e, fazendo uma analogia com um dogma católico, quase sempre são lançados em um limbo onde ao mesmo tempo em que sonham chegar ao céu, têm pesadelos diários com as perspectivas cada mais reais e factíveis de mergulhar de vez no inferno e terem um corte decisivo e fatídico em suas carreiras.

Assim, para que “El Turco”, daqui em diante e durante toda esta temporada, consiga colocar em campo todos aqueles e outros vários Atléticos que o jogo contra a Caldense mostrou que existem e são possíveis, é preciso que o clube se precavenha contra um fenômeno que geralmente é devastador: A DESCONTINUIDADE.

A manutenção de um plantel “largo” como prioriza e festeja Mohamed é fundamental para que isto aconteça. Não há planejamento que se sustente ou não há como falar em planejamento se, por exemplo, o elenco atleticano for perigosamente reduzido, seja por qual razão, e se o processo de transição da base para o profissional continuar sendo uma aventura para todo e qualquer garoto ali revelado.

Nada como um dia após o outro. De um jogo para o outro e este próximo, o primeiro confronto de um mata-mata decisivo, o Atlético tem, não tão de repente, seis novos desfalques. Cinco deles mais que previsíveis, em razão de convocações para os jogos das eliminatórias da Copa do Mundo e um sexto em decorrência de uma infelicidade de Dodô. Coisas do Atlético e do futebol. E, para o segundo jogo da semifinal do Mineiro contra a Veterana mais um sétimo desfalque de última hora: Everson, convocado de emergência para a seleção brasileira. Mais uma do esporte bretão.

Recentemente em uma matéria da TV Galo o clube reconheceu que só conquistou o que conquistou em 2021 e ratificou com a supercopa em 2022 porque tem um elenco de qualidade e em quantidade que deu sustentação ano passado ao trabalho de Cuca e este ano vem lastreando o trabalho de Antônio Mohamed. A continuidade desta filosofia, onde a prática ratifica o discurso, é a garantia que “El Turco” precisa.

Nada como um dia após o outro. “El Turco” precisa de paz, tranquilidade, estrutura, material humano e opções em quantidade e em qualidade, para se alternarem e obterem os resultados esportivos que todo atleticano deseja.