Coluna Preto no Branco: As bruxas estão soltas novamente?
Foto: Pedro Souza
Por: Max Pereira, colaborador independente, de Belo Horizonte
A nova contusão de Keno, nem bem o atacante atleticano havia se recuperado de uma insólita lesão no quadril, levou o atleticano a imaginar mil e uma razões que pudessem justificar o ocorrido. Carma? Azar? Sina? Coisas do futebol? Maldição? Coisas de Atlético?
Afinal, era a quarta vez nessa temporada e ainda estamos no mês de abril que Keno é afastado das atividades em razão de algum problema físico. Depois de desconfortos musculares, de sentir um dos joelhos e o quadril, Keno agora precisou passar por uma cirurgia de emergência em um de seus olhos. As bruxas estão soltas novamente? E você acredita em bruxas? Você acredita nesses seres que, para muitos, são do mal e fonte de muitos problemas, acidentes e até infortúnios de proporções incontroláveis? Um dos mais populares e conhecidos provérbios espanhóis nos ensina que, independentemente de nossa crença nelas, as bruxas existem.
“Yo no creo en las brujas pero que las hay, las hay” é um dito popular castelhano cuja origem se perde nos séculos e que se tornou universal. Particularmente, também não acredito nas bruxas, mas que elas existem, elas existem. E mais: nos fascinam, nos enfeitiçam, nos seduzem.
Mas, será que elas são mesmo as reesposáveis pelas sucessivas lesões de Keno? Será que são elas as causadoras da grave contusão de Dodô que o levou a ser submetido a uma delicada cirurgia no joelho e a ficar afastado dos campos por tempo indeterminado? Será que elas estão mesmo por trás da gravíssima lesão em um dos joelhos do jovem zagueiro do sub-20 Leo Simoni que rompeu os ligamentos de um dos seus joelhos e só deve voltar a jogar futebol no final desta temporada? Será que as tais bruxas provocaram a fratura na mão de Echaporã quando ele ainda estava clube? E será ainda que elas são as reesposáveis pelas recorrentes lesões musculares de Mariano, pela contusão de Zaracho, pelas torções de joelho e de tornozelo Vargas ou pelos frequentes problemas físicos de Jair?
Se elas são mesmo as culpadas de tudo isso que aconteceu nesses primeiros meses do ano porque será que escolheram a cidade do Galo para destilar todo o mal que carregam? O jejum de títulos do Atlético no Brasileirão e os vários dos incidentes de percurso que tiraram o Galo da rota de várias conquistas ao longo dos últimos 50 anos foi atribuído por muitos à pintura da imagem de Nossa Senhora na sede de Lourdes, promovida pelo então dirigente Alexandre Kalil. Outros juravam de pés juntos que uma caveira de burro havia sido enterrada ou na Vila Olímpica ou no Mineirão. Outros tantos acreditavam piamente que uma promessa feita e não cumprida pelo ex-treinador Telê Santana em agradecimento à conquista do título brasileiro de 1971 era a razão dos males atleticanos.
“Tem que levar os jogadores do Atlético para serem benzidos pelos barbadinhos”, defendiam alguns. “Talvez um banho de descarrego seja suficiente”, diziam outros. Ainda que eu não consiga desprezar o poder das bruxas, mesmo porque aprendi com Shakespeare que “existem mais mistérios entre o céu e a terra do que pode imaginar a nossa vã filosofia”, tem coisas que não são fruto do sobrenatural e, tampouco, resultante das artes de quaisquer seres malignos.
Misticismo à parte é fato que, embora o futebol seja um esporte de contato e que, por isso, normalmente aqueles que o praticam ficam expostos à ocorrência de diversos tipos de lesões, o Atlético historicamente e, por vezes mais que preocupantes e fora da curva, vê seus atletas se contundirem durante os treinamentos. E o pior: muitas vezes com gravidade e acarretando prejuízos irrecuperáveis para o time e para o clube.
Os mais velhos se lembram das recidivas contusões musculares do Xodó Marques sempre que o Atlético se aproximava das fases mais decisivas, tensas e pesadas das competições que disputava. Como não nos lembrar da estúpida contusão do zagueiro argentino Capria em um inconsequente rachão, primeira atividade de que ele participou na Vila Olímpica, antigo local de treinos do clube? Uma dupla fratura de tíbia e de fíbula tirou o argentino do campo por tempo considerável e marcou definitivamente o resto de sua carreira.
E como esquecer que Ronaldinho Gaúcho quase ficou de fora do mundial interclubes graças a uma lesão muscular gravíssima que sofrera durante um treinamento? Recuperado miraculosamente graças a um fisioterapeuta particular contrato por ele (Filé), R10 foi a campo em Marrocos, infelizmente bem distante de sua melhor forma. Richarlyson, outro atleta lesionado durante os treinamentos. Nem chegou a viajar para o Marrocos. Se aguçarmos a nossa memória certamente nos lembraremos de dezenas e dezenas de outros casos de jogadores que se lesionaram com gravidade variada durante algum treinamento. Contusões musculares de todos os tipos, fraturas, torções de joelho e de tornozelo, etc., etc., etc…
Renato Gaúcho foi a última estrela do “Dream Team” atleticano a se apresentar e a iniciar os treinamentos. No afã de se nivelar aos companheiros o mais rápido possível, ele começou a treinar sozinho, fazendo corridas na Avenida Raja Gabaglia depois que sol se punha. Uma lesão muscular na panturrilha de difícil tratamento e recuperação retardou a sua estreia e, por se tratar de uma contusão recidiva, que reapareceu inúmeras vezes durante a temporada, comprometeu o seu rendimento com a camisa alvinegra e o tornou alvo da fúria da torcida que preferia acreditar que ele era um mau profissional e apenas queria “mamar nas tetas do clube”.
Esses e outros casos me levam a imaginar que algumas bruxas podem ser de carne e osso, simples mortais como qualquer um de nós e que apenas erram na condução de seu mister. Quantas vezes me vi perguntando a mim mesmo se tais contusões, mais que fruto do azar ou de alguma bruxaria, não seriam consequência de algum treinamento inadequado com o biótipo do atleta, expondo-o a alguma carga excessiva? Ou poderia, por alguma razão, haver, vez ou outra, algum descompasso entre a fisiologia e a preparação física?
Buracos em algum dos gramados dos campos de treinamento poderiam ser a razão de algumas torções de joelho ou de tornozelo? Excesso de energia ou de competitividade, inflado pela disputa de titularidade ou de espaço com o treinador poderiam estar na raiz de algum choque mais violento ou de uma dividida mais ríspida que, infelizmente, tenha lesionado alguém com certa gravidade?
Em seu primeiro treinamento na cidade do Galo e já foi com bola, R10 deu uma “caneta” em Leandro Donizete. Imediatamente, enquanto alguns gritavam para ele não fazer aquilo mais, pois era grande o risco de provocar uma reação dura do bravo volante atleticano, outros gritavam para o General: “pelo amor de Deus, Donizete, perdoa o Bruxo. Não quebra ele não”. Brincadeiras à parte, o risco de jogadas violentas em coletivos e rachões é imenso. E cabe a quem conduz os trabalhos, cada qual em seu nível de poder e responsabilidade, cuidar para minimizar o máximo possível os riscos de contusão. Zerar a ocorrência de leões é impossível. Agir para minimizar é mais que possível, é obrigação.
As bruxas estão soltas novamente? Pelo sim e pelo não “te esconjuro Satanás, arre égua. Saravá, Mizifio. Pé de pato Mangalô, três vezes. 1, 2, 3. Cruz credo. Sai de retro Coisa Ruim”.
*O texto não significa, necessariamente, o pensamento do Fala Galo.