Balanço, movimentação financeira e a falta coragem para expor os problemas

 

Prof Denilson Rocha
Do Fala Galo
30/12/2019 – 06h13
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O ano vai chegando ao seu final, terminam os campeonatos nacionais e ficamos com alguns torneios internacionais e os amistosos de final de ano para matar nossa fome de futebol. Se antes entrávamos no período das especulações e das negociações de jogadores, agora somos, também, “especialistas” em gestão e finanças e passamos a acompanhar e discutir orçamentos, balanços e movimentação financeira. 

O orçamento do Atlético para 2020 já foi revirado e analisado infinitas vezes em TVs, rádios, jornais, portais, blogs… tirando a polêmica interpretação dos 80 milhões em empréstimos para fluxo de caixa, todas as avaliações chegaram à mesma conclusão: o Galo continua sem dinheiro, vendendo o almoço para pagar a janta e a tal da austeridade pode apenas ser trocada por um apelido qualquer, mas continuará a ser a tônica do clube em 2020.

Para quem acompanha as finanças do Atlético, essa condição não é recente. Ainda que exista pouca transparência quanto à origem das dívidas, todos temos como realidade que o Galo é um clube endividado, que ano após ano tem prejuízos, que parte importante das receitas é destinada ao pagamento de juros e que existem enormes limitações para investimento no time. Acrescente, ainda, o frequente descontrole na aplicação dos recursos, a corriqueira antecipação de receitas, as contratações equivocadas, a falta de recolhimento de tributos… no final, temos a receita para colocar qualquer clube em estado falimentar – e assim estão diversos outros clubes brasileiros. 

Muitos clubes eram dados como quebrados, com dívidas impagáveis. E o Atlético era um dos clubes que mais se enquadrava nessa condição, com dívidas das mais variadas possíveis, como as trabalhistas, tributárias e a mais perversa e nefasta de todas, as bancárias.

O famoso PROFUT (Lei 13.155/2015) deu fôlego a algumas instituições com o parcelamento dos débitos tributários e o perdão de juros e multas. Mas também impôs uma série de regras que precisam ser rigorosamente cumpridas para que o benefício seja mantido. O Atlético soube se aproveitar da situação e grande parte das dívidas do clube foi enquadrada no PROFUT. Amenizou a situação, mas não resolveu tudo. Ainda tem muitas coisas a serem resolvidas.

A grande “surpresa” de 2019 veio do rival do outro lado da Lagoa. Surpresa para muitos e algo previsível para alguns poucos. Ao iniciar o ano, muitos colocavam o clube estrelado como um dos favoritos aos títulos nos Campeonatos, um dos melhores elencos do Brasil e um clube vencedor, organizado e saneado. Mas a receita adotada por eles, quase a mesma que nos deu o título da Libertadores só que com muito mais gastos, ao que tudo indica era alicerçada na previsão de se ganhar ao menos um título importante a cada dois anos, além de conseguir ótimas classificações em todos os demais torneios que disputassem. Alguns poucos tinham a ousadia de apontar os riscos do endividamento crescente, de salários e bichos milionários e dos perigos de depender de premiações por conquistas para cumprir com os compromissos financeiros. Se diziam que a conta ia chegar, chegou… E não vamos fechar os olhos que também já foram feitos muitos alertas para o Atlético. Com todas as críticas já feitas ao presidente Sette Câmara quanto às decisões esportivas, precisamos reconhecer que, na gestão do Clube, está ajustando as contas e desarmando a bomba relógio que estava na Sede de Lourdes. A grande surpresa neste aspecto portanto, foi a conta não chegar do nosso lado da Lagoa.

O rival precisa ser observado com bastante atenção porque ainda não estamos completamente a salvo de passar dificuldades ao menos semelhantes.  Sanear o clube é um exercício de persistência. Contratar medalhões, pagar salários astronômicos e deixar a conta para outro é fácil… Colocar a casa em ordem, aguentar as críticas e, provavelmente, ver o sucesso aparecer somente quando outro estiver à frente do clube já não é tão fácil. O que o Flamengo está colhendo hoje é fruto de um trabalho iniciado há muitos anos e as pessoas responsáveis (e muito questionadas à época) não aparecem hoje para receber os devidos méritos. Do nosso lado, ao que tudo indica, o atual mandatário procura não se enquadrar neste perfil do “anjo oculto” e planeja obter sua reeleição para tentar algumas façanhas, dignas de alça-lo à galeria dos “imortais” do clube, ao lado de seu padrinho, Alexandre Kalil. Entrega do Estádio do Galo, clube saneado financeiramente e, se tudo conspirar a seu favor, ao menos um título de repercussão nacional ou internacional.

Enquanto clubes como o Corinthians continuam a viver a irresponsabilidade financeira, quem faz o dever de casa sofre. A previsão de déficit do Corinthians para 2019 é próxima de 180 milhões de reais. Valor superior aos orçamentos totais de CSA e Chapecoense, rebaixados por sobreviver apenas com o que arrecadam. Pior, rebaixados pagando salários em dia enquanto outros colecionam meses de atrasos nos pagamentos a atletas e funcionários, como, por exemplo, o Vasco.

Ainda não é possível determinar qual o real tamanho do buraco que deixaram no rival estrelado. Todos os dias surgem novas dívidas, cobranças, processos e questionamentos. Em recentes entrevistas, os diretores recém nomeados dizem que a dívida deles seria muito maior que os R$700 milhões divulgados, beirando na verdade quase R$1 bilhão. Certo é que, os muitos funcionários do clube sofrem ao não receber seus salários e não terem perspectivas por um futuro recente um pouco melhor. Enquanto isso, os responsáveis pela situação desaparecem em suas viagens pela Europa. O presidente recém-deposto não é o único responsável pela situação crítica que foi sendo formada em décadas de negociações obscuras. Exatamente como no Atlético, embora há de se ressaltar que nosso patrimônio é muito maior que o deles.

O rival entrou em colapso financeiro. As receitas previstas para 2020 são muito inferiores ao realizado nos anos anteriores. Pior, praticamente tudo o que podia, já foi antecipado. É difícil imaginar de onde virá dinheiro para pagar as contas já vencidas e ainda manter as operações do clube. A situação é tão dramática que os atuais mandatários (“conselho de notáveis” é o nome pomposo para salva-vidas?) falam em “moratória”. Para os que não conhecem o termo, é pedir aos credores um tempo maior para pagar a dívida. No ditado popular, “devo, não nego, pago quando puder”. Mas é preciso avisar aos “notáveis” que não existe moratória na legislação do PROFUT. Ao contrário, o clube do lado de lá já infringiu a Lei por diversas vezes e, fosse um país sério, já deveria ter sido rigorosamente punido.

Enfim, por que devemos observar o que está acontecendo no rival? Para que não tenhamos a mesma arrogância e achar que não vai acontecer do lado de cá. A situação do Atlético ainda é crítica e precisa de muito tempo para colocar a casa em ordem. Isso deveria ser suficiente para justificar muito do que a atual diretoria vem fazendo. Deveria, mas não é… Para que a Massa compreenda os problemas do Galo e dê apoio para as soluções a serem apresentadas, é preciso transparência, clareza e comunicação permanente. É preciso buscar a participação e o envolvimento da Torcida. Não existem mágicas ou milagres. É preciso coragem para expor os problemas e ousadia para solucioná-los, junto com a Massa. Mas também é preciso, antes que se proponham a venda do que ainda temos do Diamond, que sejam explicadas as origens de nosso endividamento e a estrutura aprovada de composição dos juros pagos às instituições financeiras tidas como “amigas do clube”! Afinal: amigos, amigos! Negócios, à parte!