Gestão profissional do elenco – Parte 2

Foto: Flickr oficial do Atlético

 

Por: Silas Gouveia / @silasgouveia17

O que se espera de um clube que tem pretensões e necessidade de voltar a ser protagonista no futebol nacional é que tenha uma gestão profissional, exemplar e modelo, assim como os grandes clubes do mundo. Espera-se corte de gastos secundários e que tenha foco no carro chefe do clube, que é o futebol. É isto que parece estar sendo pretendido implantar no Atlético com a atual administração, composta, dentre outros, por quatro grandes e bem sucedidos empresários brasileiros, como Renato Salvador, Ricardo Guimarães, Rafael Menin e Rubens Menin. Responsáveis por empresas como o Grupo Materdei de hospitais, os bancos BMG e Inter e a construtora MRV, o envolvimento destes empresários na gestão do Atlético é um bom aval para quem quer fazer parte do Clube, atletas ou não. A liderança de pessoas tão representativas é um atrativo para que outros profissionais de destaque se interessem a vir participar do projeto de reconstrução e profissionalização do Galo. A construção e gestão de um elenco qualificado faz parte disto.

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Como core business do Clube é o futebol, o mínimo que se espera é que a profissionalização comece de fato no futebol. Espera-se estrutura enxuta e bons atletas, com potencial de crescimento tanto nos que são adquiridos quanto nos desenvolvidos na própria base. Mas também é preciso mesclar com atletas já experientes e, se possível, que tenham grande visibilidade internacional. E o principal fator de convencimento para a contratação de um grande profissional, quer seja jogador de futebol ou executivo ligado às diversas áreas de atuação do clube, é que se tenha um bom planejamento, um plano de carreira e a garantia de boa remuneração, sempre em dia – o que nem deveria ser tratado como diferencial, já que é uma obrigação do empregador. E isto é muito difícil, principalmente em tempos de pandemia, quando as já escassas receitas diminuem ainda mais e as despesas permanecem altas, ou até mesmo, aumentam. Salários em dia e premiações por metas em competições, são sempre excelentes atrativos para vinda de grandes atletas.

 

TENCNOLOGIA PARA A AVALIAÇÃO DE CONTRATAÇÕES

Os clubes têm investido muito em setores como os de Avaliação de Desempenho, não somente para avaliarem seus próprios atletas, mas também para monitorar o mercado em busca de peças que possam completar tecnicamente a equipe. Para isto, empresas e profissionais especializados neste seguimento têm sido muito disputados no mercado. Recentemente o Atlético contratou Felipe Ribbe para o cargo de Gerente de Inovação, mas também assinou contrato com empresa especializada em aplicação de ferramentas gerenciais informatizadas.

Uma máxima do meio esportivo diz que cada contratação é sempre uma aposta. Para mudar isto, os clubes têm investido cada vez mais em Informatização dos processos de análises e avaliações. A Tecnologia da Informação tem ocupado cada vez mais espaços dentro dos clubes. Uma inteligência artificial capaz de interpretar uma gama enorme de dados coletados e transformá-los em processos de decisões – data driven. Os clubes registram cada movimento dos atletas, cada característica de cada um, seus dados fisiológicos, suas potencialidades e também suas fragilidades. Exames médicos e laboratoriais complementam os dados e o conjunto destas informações precisam ser processadas e entregues por vezes mais de duas sessões diárias. O papel das comissões técnicas vem sofrendo mudanças graduais e intensas a cada momento, ajudando o técnico nas tomadas de decisões. O próximo passo que os clubes estão tentando dar é a análise do perfil de treinadores frente às características de jogo que o clube prioriza, como objetivo de ter sempre uma evolução e nunca um recomeço.

 

AVALIAÇÃO, ANÁLISES, DECISÕES – CONVICÇÃO

As ferramentas integradas e informatizadas auxiliam muito em toda cadeia de processos decisórios. Os setores de fisiologia, médico e todos os demais que servem de suporte para que a comissão técnica possa levar a campo o melhor time para disputa de uma partida, todos fazem uso de processamento de dados para que possam entregar relatórios completos ao comandante, com o objetivo de facilitar suas tomadas de decisões. E mesmo assim, se não houver o comando forte, nada adianta.

Nos processos decisórios de diretoria também se faz necessário o auxílio destas ferramentas de análises de dados. A tomada de decisão para a contratação de um atleta, ou mesmo de um profissional especializado para determinada área do clube requer uma avaliação criteriosa e baseada em dados consistentes da real necessidade de um profissional e, em seguida, a escolha do mesmo.

Entretanto, as tomadas de decisões, quer sejam elas pelo técnico à beira do campo, quer sejam dos dirigentes dentro de seus gabinetes, esbarram sempre em um fator de peso: a convicção. Sem convicção, não há ferramentas ou avaliações consolidadas que façam com que, aqueles que têm o poder de definir, tomem decisões rápidas, seguras e direcionadas a atingir os objetivos propostos. Ao final, sem convicção, resta a dúvida do custo-benefício da decisão. E este custo, muitas vezes, nem está relacionado ao valor a ser gasto, mas sim a possíveis desgastes e riscos que o dirigente (técnico ou diretor) terá de assumir por aquela decisão. Convicção é o grande divisor de águas.

Pode-se dizer que, no final de 2019 e início de 2020, faltou convicção à diretoria para a tomada de decisão na escolha do nome do técnico para o período de 2020/21. A escolha inicial em Rafael Dudamel, com sua pouquíssima experiência em clubes, demonstrou ter sido uma aposta mal avaliada e sem a necessária convicção em sua capacidade de trabalho. Por sorte, a tomada de decisão de sua saída foi rápida, embora dispendiosa.

Em seguida, a chegada conturbada e tardia de Jorge Sampaoli ao Atlético pode ter ajudado muito para uma correção de rota e contribuído para implantação de um modelo de jogo, baseado no Jogo Posicional. Mesmo com sua saída precoce e um tanto traumática, com apenas um ano de trabalho no clube, graças ao acompanhamento de perto da comissão técnica permanente, o clube conseguiu aproveitar o conceito básico de um jogo posicional, com saída de bola sustentada e os atletas que estiveram envolvidos neste processo carregam uma carga de conhecimento tático, posicional e jogo coletivo que pode e deve ser aproveitado por treinadores que o sucederem no clube. O que pode ter sobrado de capacidade técnica parece ter faltado na gestão de pessoas ao Sampaoli. No Brasil, um exemplo bem sucedido e que demonstrou acima de tudo uma convicção no projeto que deveria ser implantado no clube, foi o do Clube Atlético Paranaense, quando investiu e deu suporte ao técnico Thiago Nunes para a implantação de um modelo de jogo praticado até hoje, por técnicos que o sucederam.

CUSTO DE CONTRATAÇÕES

Em um mercado que movimenta bilhões e onde os salários dos principais profissionais são altíssimos, avaliar o custo de uma contratação não é uma tarefa fácil. Ao contrário, se o principal objetivo é esportivo – espera-se que os atletas sejam decisivos para títulos –, o jogador é muito mais que só um ativo em campo.

Muito tem se falado dos investimentos que o Atlético vem fazendo recentemente. Mesmo os que insistentemente falam em mais de 200 milhões aplicados para contratações deixam de considerar muitos elementos. Porém, não se deve avaliar somente o valor para aquisição de um profissional quando se monta uma equipe competitiva, mas também o que esta aquisição poderá representar em imagem, visibilidade, atração de parceiros e, claro, crescimento técnico da equipe. Composição de padrão de jogo e, talvez o mais importante, a valorização de atletas vindos da base do clube e cuja rentabilidade certamente será absurdamente maior que qualquer outra possível venda de atletas adquiridos ao longo dos anos.

Estes foram os investimentos com atletas que o Atlético fez entre 2020 e 2021:

Todos os valores são aproximados e baseados em informações divulgadas pela imprensa ou coletadas no site do Transfermarket

Ao analisar apenas os valores divulgados e comparando com o provável preço atual de mercado, pode-se fazer uma análise de que o Atlético, apesar de ter gasto muito, ainda pode faturar mais receitas com possíveis vendas do que gastou com a aquisição dos mesmos – e nem estamos considerando a valorização dos atletas que já estavam aqui ou que foram recentemente promovidos da base. Mas, novamente, esta conta não é tão simples assim. Primeiro por que o clube não pode se desfazer de todos os atletas. Segundo é que o preço de revenda depende de haver interessados em suas compras e sabemos que o mercado anda desaquecido. Ainda assim, é possível perceber que o melhor desempenho em campo (de 13º em 2019 para 3º em 2020) se reflete na valorização do elenco. Os tão falados 200 milhões em contratações se transformaram em um valor muito maior tanto no elenco quanto na marca do Clube. E é isso que diferencia o que é um simples gasto do que é um investimento realizado de forma profissional e planejada.

Os gastos com atletas no período de 2020/2021 de fato são considerados elevados. Principalmente para um clube com alto nível de endividamento e num período de plena pandemia, com receitas em queda e despesas mantidas. Entretanto, pela primeira vez em muitos anos, o perfil dos atletas seguiu uma linha de trabalho definida. Não pareceram contratações aleatórias ou por simples indicação de treinador. Estilo de jogo, potencial de revenda e mesmo experiência em jogar em times com padrões de jogos semelhantes ao proposto pelo clube, definiram praticamente todas as contratações. É bem verdade que o dinheiro gasto para estas contratações foi de empresários que hoje estão no comando das atividades do clube, em uma gestão conjunta com o atual presidente. Portanto, ainda não se pode dizer que nossos dirigentes têm convicção naquilo que preparam para o clube, pois o perfil de investimento em atletas pode ter prevalecido, visando simplesmente o retorno financeiro de suas vendas. Mesmo assim, podemos dizer que o perfil atual do elenco do Atlético é tecnicamente bem definido.

 

O CAMINHO PARA SE TORNAR EXCELÊNCIA EM GESTÃO DE FUTEBOL

O processo de profissionalização de gestão parece de fato estar sendo iniciado no Clube Atlético Mineiro. Uma gestão voltada à valorização e exploração de sua marca, profissionalizando departamentos, padronizando processos, equilibrando gastos com perspectivas de receitas no carro chefe do Clube: O futebol! Mas falta muito ainda para coroar a implantação desta gestão profissional no Galo. Ganhar títulos importantes é fundamental, até mesmo para conseguir equilibrar o mais rápido possível, as equações das finanças do clube. Falta ainda a transparência de suas ações e prestações de contas.

Há de se entender, entretanto, que isto é como ensinar a andar de bicicleta. Começa com o auxílio de rodinhas extras. Depois tira-se uma delas e só então parte-se para andar sem a necessidade de amparo. Participar de torneios ciclísticos é ainda um sonho distante, assim como ver o clube entre ao mais bem administrados do Brasil, depois da América e do mundo. Ainda estamos nos apoiando nas rodinhas. Na verdade, em 4 “R”odinhas!