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Uniformes – Fornecedores de Mantos – Lucros ou prejuízos, com que roupa eu vou?

Por: Betinho Marques

Ao longo de alguns dias, pesquisamos um pouco sobre o mercado de fornecimento de uniformes com alguns especialistas, para que pudéssemos deixar saber de forma elementar sobre o que pode ser vantagem neste negócio e como benefícios de ontem podem não contemplar o amanhã.

Neste contexto, elencamos quatro modelos de negócio para o fornecimento de material esportivo, vejamos:

Os quatro modelos

Modelo 1 – Valores Altos – O primeiro, considerado ideal e muito praticado até 2014, é o formato em que o fornecedor paga um valor grande anual ao clube além de fornecer o material esportivo utilizado pelos atletas. Hoje, poucos clubes mantêm esse tipo de vínculo no Brasil, dentre eles, citamos Corinthians (Nike), Flamengo (Adidas) e Grêmio (Umbro) se enquadram neste formato.

Alguns aspectos relevantes deste cenário são: como as fornecedoras são referências mundiais e rapidamente associadas ao negócio futebol, não fazem muita questão de flexibilizar nada. Contratos são bem rígidos e as coleções seguem uma linha conceito, ou seja, há pouca maleabilidade para customização do material. Todavia, por exemplo, o Corinthians já teve uniformes especiais como a linha do ídolo Ayrton Senna, previamente planejada.

Recentemente, no início de dezembro de 2020, o Grupo SBF, dono da Centauro, concluiu a compra das operações da Nike do Brasil por R$ 1 bilhão. O grupo será responsável exclusivo pela distribuição dos produtos Nike, incluindo, roupas, calçados e acessórios e equipamentos no país, além de ser operador direto do site da loja virtual até maio de 2030. O grupo também será o varejista exclusivo das lojas físicas Nike, sendo o responsável pela comercialização de produtos ao consumidor final nas lojas da marca e podendo abrir e operar lojas pelo período inicial de cinco anos.

No Corinthians, a Nike completa em 2021, 18 anos de parceria. O contrato tem vigência até 2029 e fora renovado no fim de 2017. Pelo sabido, até a renovação o clube paulista recebia o equivalente a R$ 30 milhões por ano, condição que foi melhorada na renovação, inclusive com o recebimento de luvas que chegaram a cerca de R$ 25 milhões.

O Flamengo tem um contrato com a Adidas que vai até 2023, mas há uma certa insatisfação com a empresa alemã, já que, em avaliação recente o clube entende que a Olympikus em 2009 atendeu e vendeu mais que a empresa das três listras em 2019, após vencerem o Brasileirão e a Libertadores. Pelo conhecimento geral, o Flamengo recebe cerca de R$ 18 milhões com seu contrato, além de royalties e premiações. A Adidas ainda fornece material no Brasil para: Internacional, São Paulo e Cruzeiro, sempre mantendo a peculiaridade de estar em apenas um clube por estado, mas nesses três casos os formatos de contrato não se encaixam no modelo 1 do Flamengo.

No Grêmio desde 2015, a Umbro tem contrato com o tricolor gaúcho até 2024. Além das cláusulas de confidencialidade e proximidade com o clube, a empresa inglesa além de moldes similares do Modelo 1, que paga altos valores aos clubes, deve fornecer 50.000 peças por ano ao clube e pagar 17% sobre as vendas do material esportivo do clube gaúcho O mesmo formato de contrato da Umbro com o Grêmio não é seguido nos demais clubes patrocinadores pela marca (Fluminense, Avai, Athletico, Chapecoense, Santos e Sport);

Modelo 2 –  Performance – No segundo, o fornecedor passa ao clube a responsabilidade sobre desempenho de vendas. Ou seja, o clube recebe apenas se vender. Este é formato de grande parte das marcas. Clubes como Cruzeiro (Adidas), Inter (Adidas) e Fluminense (Umbro) possuem contrato por performance. De forma resumida, clube e fornecedores negociam percentual sobre o preço de venda das camisas e o valor correspondente de lucro de cada uma. O clube fica responsável pelo pagamento dos materiais que utilizar. Este pagamento é feito por encontro de contas entre o valor a receber pela venda ao mercado e o valor consumido.

Modelo 3 – Marca própria – O terceiro modelo é o de marca própria, em que o clube compra diretamente do fabricante. Neste caso, é responsável pelo desenvolvimento da coleção e lançamento, sem suporte de um fornecedor. Neste caso, o clube delibera os valores de venda ao mercado e quanto de lucro irá receber. Além disso, o clube paga pelo que consumir com seus jogadores. Esse é o caso de clubes como Coritiba (1909 – própria), Bahia (Esquadrão), América- MG (Sparta);

Modelo 4 – Uso da grife – O uso de grife é uma mistura do modelo 2 e 3. Neste caso, o clube não utiliza uma marca parceira que não “coloca dinheiro”, mas é o clube quem contrata diretamente do fabricante. Neste caso, ele também é responsável pelo desenvolvimento da coleção e lançamento, com suporte de um fornecedor mas mantém o direcionamento sobre sua coleção, é ele (clube) quem delibera os valores de venda ao mercado e quanto de lucro irá receber, sem qualquer pagamento à marca, que ganha apenas a exibição da sua marca aos torcedores do clube. Neste caso, o clube também paga pelo que consumir com seus jogadores. Esse é o caso de clubes como Remo e Vasco (Kappa), Atlético (Lecoq) por exemplo.

Fizemos pesquisas e considerando o não acesso a documentos que possuem cláusulas de confiabilidade, conseguimos “desenhar” um seguinte fluxo do modelo de negócio aproximado, vejamos:

As contas – Exemplos

Contas – Formato Adidas modelo 2

Custo aproximado de produção do uniforme – R$ 70,00

Custo de venda para lojistas ———————– R$ 120,00

Custo de venda ao consumidor final ————-R$ 250,00

Lucro estimado da Marca: R$35,00

Lucro estimado do Clube: R$ 15,00

 

Contas – Formato Galo modelo 4

Custo aproximado de produção do uniforme –– R$ 70,00

Custo de venda para lojistas ———————– R$ 120,00

Custo de venda ao consumidor final ————-R$ 250,00

 

Agora, vamos partir no esquema do fluxo inverso, que sai do consumidor final ao que vai para os cofres do clube:

Os lojistas trabalham com uma margem de venda baseada no volume de aquisição na base de 100%. Desta forma, claro, lojistas pagam funcionários, aluguel e impostos e seus lucros são diluídos dentro do valor duplicado do produto. Mas de forma nominal, o produto para o consumidor final tem um acréscimo alto por alimentar toda a cadeia produtiva – Saindo de R$ 70,00 para cerca de R$ 250,00 numa camisa de jogo principal, por exemplo.

Para o clube duas situações básicas, obviamente, com arredondamentos visto que os valores são aproximados em razão das cláusulas de confidencialidade dos clubes:

Período Topper x Le Coq – Esquema similar – Considerando o preço de venda aos lojistas – custo de produção da unidade com impostos da seguinte forma:

R$ 120,00 (custo de venda aos lojistas) – R$ 70,00 (custo de produção com impostos) = R$ 50,00 lucro

No contrato Topper, o Atlético recebeu cota anual de patrocínio e ainda teria direito15% a 20% do lucro com a venda das camisas, ou seja, receberia mais ou menos R$ 10,00 e o restante do lucro iria para a fornecedora, no caso a Topper. Já no contrato Le Coq, o lucro após o pagamento à fábrica e de todos os insumos e impostos é do Galo. A fornecedora francesa ganha na exposição da sua marca e, consequentemente, na venda dos seus produtos no mercado Brasileiro.

Fornecedores em dificuldade

Ao pesquisarmos sobre o fornecimento de material esportivo aos grandes clubes, há um consenso em quem entende do assunto: com raras exceções, as empresas fornecedoras não obtêm lucro direto ao estampar suas logomarcas nas camisas de equipes de futebol.

Para muitos, patrocinar só pela camisa é jogar dinheiro fora. A vantagem está em ter produtos acessórios, é aí que se ganha ou se pode ganhar. O uniforme em si é como um pão na padaria, ou seja, é um convite à compra de outras coisas, mas por si só, não gera lucros ultimamente. A possibilidade de lucro está na visibilidade medida de forma indireta e na compra de produtos acessórios.

Grandes multinacionais como Nike e Adidas não fazem questão de estampar suas logomarcas em clubes, com raras exceções. Empresas de renome nacional não conseguem empatar a conta (as despesas maiores que as receitas), desta forma, seguem o exemplo da Topper que teve problemas ao atender o Atlético e saem no negativo. No caso da Le Coq e Atlético, há uma espécie de sociedade, na qual o clube é responsável por pagar os custos produtivos e “estampa” a Le Coq sob sua responsabilidade, inclusive nos quantitativos vendidos e consumidos.

Manto da Massa

O formato do contrato celebrado aos moldes pelo Atlético e Le Coq facilitam a criação de estratégias de venda diversas, e que viabiliza a oportunidade do momento. O sucesso do Manto da Massa só foi possível devido a um fator primordial: a maleabilidade da relação Le Coq e Atlético. Através de uma parceria com maior flexibilidade, o Galo vendeu mais de 100.000 camisas e lucrou valores próximos aos R$ 8 milhões de reais líquidos, ou seja, uma referência próxima a 40% do faturamento que girou acima dos R$ 19 milhões, bem acima das vendas convencionais de linhas lançadas anualmente. Considerando os lançamentos convencionais, ao vender cerca de 100.000 unidades, o clube lucra cerca de R$ 3.000.000,00, ou seja, aproximadamente 12% sobre o valor de venda ao consumidor final (para facilitar).

Neste processo, lembrando da cadeia produtiva, o custo do manto, de forma análoga entre R$ 70,00 e R$ 80,00 foi vendido de forma direta ao consumidor final. O lojista que seria o intermediário do processo não participou. Com isso, o material foi repassado ao torcedor por pouco mais que o dobro do valor e, mesmo assim, ainda saiu mais barato, cerca de R$ 170,00, sem embutir os custos de frete na conta. Houve ainda problemas com a demora e não entrega de parte dos mantos que ainda não foi sanada em 100%. Todavia, no cômputo geral, o sucesso da ação foi incontestável.

Marca Mundial

Já se ouve falar nos bastidores, na possibilidade de o Atlético associar sua marca à Nike num futuro próximo, até para alavancar uma nova estratégia de marcas positivas. O Galo, próximo de inaugurar seu estádio, com uma administração mais estável e um time com mais valor de mercado poderá pleitear condições diferentes e melhores para seus contratos, tornando-se interessante à multinacional. O desafio estará em medir a valorização da marca, que só é aferida quando se consegue decodificar isso em favor dos cofres do clube.

Vale dizer que a Le Coq é uma grife charmosa (fundada em 1882), que gerou ao Atlético um acréscimo de valor, somando mais um Galo ao lado do distintivo. Todavia, há muito tempo a fornecedora francesa não faz questão de ser uma marca que vive a estampar seu símbolo indiscriminadamente em equipes de futebol, como no passado. Foi uma oportunidade que surgiu diante da dificuldade do clube mineiro em se acertar após contratos contestáveis com Lupo, Dryworld, Puma e Topper, numa batida à porta dos franceses.

A vantagem foi que a Le Coq já tinha visibilidade reconhecida e se juntou a um mercado fiel que é o torcedor do Atlético. Com isso, pode, inclusive, criar a oportunidade de vender seus produtos como calçados e outras peças do vestuário. Para o Galo, é uma espécie de cheque em branco, que deixa o clube mais à vontade para coordenar suas necessidades, uma espécie de modelo 3, mas que em vez de criar uma marca própria, já se apropria do famoso galo francês, numa associação de marcas fortes. Nessa junção, o Atlético construiu a ideia do Manto da Massa meio que de supetão, no “susto”, no período da pandemia do coronavírus e cuidou de todo o processo sem muitas interferências da fornecedora francesa.

Mudar de fornecedor é um “pesar da balança” e é um assunto peculiar. Cabe avaliar o retorno em função das potencialidades, da maleabilidade e da força de sentar-se à mesa para associar-se de forma proporcional aos benefícios que uma parceria pode trazer. “O remédio que é bom para mim pode não ser bom para você. Mais ainda: o bom de ontem pode ser obsoleto no amanhã. O clube muda de ambição, portanto, pode mudar também seus parâmetros e, se antes batia à porta desesperado, pode esperar o chamado”.

Um exemplo, o Coritiba, que também lançou uma marca própria recentemente, pensa em 2021 em ter um modelo híbrido, no qual possa manter a marca 1909 que gerou mais lucros que grandes empresas como (Adidas e Nike), mas que não consegue atender todas as suas necessidades. Desta forma, a ideia do Coxa agora é ter uniformes de jogo voltando ao modelo tradicional com uma marca consolidada (Kappa – uma das cotadas) e usar a marca própria para o complemento nos outros produtos. Enfim, casamento pode ser bom e ruim.

A receita do sucesso depende do entendimento real do tamanho de cada um, do seu mercado e de não “dourar a pílula”, precisa ser na ponta do lápis.

 

*** O Fala Galo entrou em contato com o Diretor de Negócios, Leandro Figueiredo, para enriquecer o conteúdo, que mesmo não podendo dar detalhes sobre as parcerias de fornecimento de materiais do clube, destacou os seguintes pontos:

Uma outra informação relevante é a equação do sucesso do clube baseia-se em um contrato com bons royalties + muitas vendas e pouco consumo interno (os chamados enxovais utilizados para as atividades de treino e jogos). Ou seja, na verdade, é uma inequação que acorde bom valor à marca do clube + seu apelo + sucesso no campo, que venda muitos produtos através do seu apaixonado torcedor e, que se possível, consuma somente o suficiente nas demandas de rotina.

O conteúdo acima é inesgotável. Os clubes ainda buscam achar a “batida perfeita” que seja a mais eficiente às suas realidades. Tudo se relaciona ao contexto cultural, o tamanho do seu público e o poder econômico de quem “consome” suas paixões, que são os clubes. Desta forma, colherá bons negócios quem for organizado na gestão administrativa e não precisar desesperadamente chegar desesperado nas negociações.

*** Observação: as contas exemplificadas nos modelos 2 e 4 não são verdades plenas dos valores (até porque há cláusulas de confidencialidade). Entretanto, são dados que buscaram se aproximar da realidade atual dos formatos e contratos estabelecidos, afim de gerar um olhar comparativo que faça o torcedor saber um pouco mais sobre o mundo do fornecimento de uniformes de forma mais didática possível.