Compliance! Que bicho é este?

 

 

Silas Gouveia e Prof Denílson Rocha
16/03/2020 – 07h13
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Em recente entrevista, logo após o Clássico, o Presidente do Atlético foi questionado sobre “transparência” no clube e respondeu: “Sim, estamos seguindo tudo. Compliance, transparência e todas as regras modernas de governança institucional!” Para os entendidos, soou como música nos ouvidos. Para aqueles que não têm a menor ideia do que seja, foi apenas mais uma fala rebuscada, com termos comuns de advogados ou empresários. Mal sabia o dirigente que, menos de uma semana após sua fala, o lançamento do novo programa de Sócio Torcedor veio desmentindo grande parte de seu discurso. Mas a mídia, por desconhecimento ou por receio de entrar num campo que poucos conhecem, sequer tocou no assunto.

Mas afinal, o que vem a ser este tal de Compliance? O que isto pode afetar o Galo e, mais ainda, o futebol do Galo?

Para começo de conversa, é preciso compreender que compliance é, simplesmente, agir conforme as regras, as leis, as normas e os regulamentos, sejam internos ou externos. Precisa ressaltar que é agir. Não é o que se fala, é o que se faz. Mais que o uso de terminologias atuais de grandes empresas ou de falar sem ter ainda conseguido implantar todas as regras e requisitos de uma administração moderna e eficiente, o gestor deve se precaver e garantir que suas palavras não poderão ser usadas contra ele próprio e, mais importante, contra a instituição que ele representa naquele momento. Não se pode encarar assuntos e políticas empresariais como se fossem “caixinhas” a serem preenchidas e discursos a serem repetidos. Governança empresarial compõe a imagem da empresa. É seu cartão de visitas, sua identidade não só para o mundo corporativo, como também para seus parceiros e, no caso de um clube de futebol, seus associados e torcedores.

A falha no sistema de cadastro de novos Sócios Torcedores expôs toda a fragilidade não só daquele sistema, mas principalmente dos discursos ensaiados da diretoria quando são confrontados sobre suas condutas administrativas. O discurso não resiste à realidade e ao mais simples ato cotidiano de seus associados. Segurança empresarial requer, sobretudo, a preservação de dados de seus clientes, dentre vários outros quesitos ligados ao tema. A Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD (Lei 13.709/2018) estabelece regras para a captação, o tratamento e a guarda de informações pessoais e define multas bastante pesadas para casos de falhas de segurança. A “sorte” do Atlético, no caso, é que a lei somente será exigida plenamente a partir do próximo mês de agosto. E segurança é parte fundamental do Compliance. Sem ela, não há como dizer que existe Compliance, visto que se evidencia a dissociação entre o discurso e a prática.

E o que isto interfere no restante das coisas e, principalmente, no futebol do clube? Tudo, eu diria! O discurso vazio desacredita a instituição junto aos torcedores, mas principalmente frente aos investidores e possíveis parceiros, além de transmitir a todos, atletas e empresários do ramo especialmente, que ali não há controle. As regras serão mudadas ao bel prazer do comandante de plantão. Os contratos não serão cumpridos e as informações sigilosas serão respeitadas até o momento que lhes convier. Passa um claro recado de que: “Invista aqui. Por sua conta e risco!”

Já não era de hoje que várias pessoas reclamavam que a diretoria do Clube tem um discurso muito bonito, mas que a prática não vem sendo conduzida de acordo com as falas produzidas. E não há, nem neste texto, nem nos comentários que se houve nas redes e em reportagens publicadas, nenhuma forma de questionamento quanto a lisura e conduta dos atuais dirigentes. Não há sequer alguma insinuação de que possa haver falcatruas ou má conduta. O que se quer mostrar é que muita coisa ainda precisa ser feita internamente no Clube antes de sair alardeando que já existem determinadas ferramentas de governança empresarial no clube, para se evitar exatamente o desgaste provocado por uma falha de um sistema de cadastro de seus usuários. Para uns, uma falha diminuta. Para o mercado, uma falha grotesca.

O Atlético vem passando por mudanças significativas no campo administrativo, mas está ainda muito longe de se poder falar que hoje seguem as mais modernas e eficientes ferramentas de governança administrativa. Para os que tem dúvidas quanto a isso, sugiro que busque o “Rating Integra”, do Instituto Ethos, e avalie se e como o Atlético atenderia aos critérios de governança, integridade e, especialmente, transparência. Com isto, volta a pairar sobre a Instituição, a aura das dúvidas antigas sobre como estão sendo tratadas as finanças do clube. Qual o grau de endividamento do clube? Como estão sendo gastos os, até aqui, parcos recursos obtidos? Como se pretende gerenciar as dívidas da instituição? Estamos de fato equacionando estas dívidas, tornando ajustáveis às receitas programadas num futuro mais próximo? Ou estamos, mais uma vez, protelando estas dívidas para um sucessor?

Compliance deveria ser uma palavra “coletiva”, vindo permanentemente acompanhada de governança e transparência. Regras e práticas de governança? Existem no Atlético? Transparência? O que isso significa no Galo? Compliance não é apenas uma palavra adotada dos norte-americanos ou do mundo corporativo. É a forma como uma empresa se apresenta e se dispõe aos seus clientes e, principalmente, aos seus possíveis investidores. Portanto, menos discurso e mais prática, por favor!