Não existe melhor Marketing do que inspirar confiança
Max Pereira
Do Fala Galo
12/01/2020 – 06h
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Não é novidade para ninguém que a rejeição ao atual presidente do Atlético no seio da massa, não sem razão, vêm aumentando exponencialmente e atingindo um patamar explosivo.
A entrevista concedida no final do ano passado pelo presidente Sette Câmara à Rádio da Massa tornou-se o tema obrigatório das rodas de bar e de muitos posts nas redes sociais. Para muitos, o que de mais importante rolou nessa entrevista foi a informação de que o Galo já tinha treinador. Para outros, entre os quais me incluo, não.
Não que a contratação de um novo treinador não fosse algo importante. Acontece que a entrevista, infeliz para vários e vários atleticanos, não só fez impulsionar a hasteg #ForaSetteCâmara, como foi bastante elucidativa em relação à forma de pensar e tratar o futebol do mandatário maior do Galo Forte Vingador.
Para muitos a entrevista teria sido apenas uma demonstração cabal da inaptidão do presidente para o cargo que ocupa. Para mim, entretanto, ela mostrou algo mais complexo e que precisa ser explicado com mais profundidade e elementos. Enfim, é preciso ir a fundo e desvelar o que, de fato, está por trás dos problemas que têm conturbado a vida do Atlético e nos trazido imensas preocupações.
O Atlético vive um paradoxo que, inclusive, já foi tema de um ensaio aqui no Fala Galo: Autocracia x Democracia, o paradoxo Atleticano. Ao mesmo tempo em que dá sinais alvissareiros na direção de uma ainda insipiente profissionalização, circundada por uma legítima e acertada preocupação com a austeridade, com o equilíbrio das contas e com a busca da realização do sonho do estádio próprio, o Atlético ainda se vê preso a um modelo de gestão feudal e ultrapassado, caracterizado por uma brutal falta de transparência e demarcado por uma postura do presidente que, não só lhe traz mais e mais rejeição por parte da torcida, como lhe corrói a credibilidade e corrompe o ambiente interno.
Os momentos positivos que inegavelmente aconteceram ficaram escondidos em razão do grande peso e da exacerbação de sempre dos momentos ruins do clube. O atleticano, sempre com a sua autoestima em baixa, quase sempre só consegue perceber e reverberar os maus momentos, o que o leva, invariavelmente, a menosprezar ou a nem enxergar tudo de bom que por ventura possa ter acontecido.
O trabalho de Chávare na base, ainda incipiente e com problemas explicáveis, a boa performance do time ao longo do primeiro turno do Brasileirão, quando se manteve inicialmente no G4 e depois no G6, o desempenho do ataque atleticano, o terceiro melhor do Brasil nesse 2019, superando até o poderoso e badalado Palmeiras, a contratação de Jair, algumas contratações pontuais para o departamento de futebol e para a base, a formação de uma equipe de transição para o profissional, são, por exemplo, algumas coisas positivas que ocorreram nestes dois primeiros anos do mandato de Sette Câmara que não têm tido a devida repercussão.
A tal austeridade, tão odiada e xingada pela massa, é uma imposição necessária e fundamental para o reequilíbrio das contas, tendo em vista o momento delicado das finanças do clube.
Acontece, porém, que os desacertos e os equívocos do comando, associados a uma comunicação institucional tradicionalmente (intencionalmente?) nula e ineficaz, a uma crônica falta de transparência, a uma recorrente falta de cuidado com a marca Atlético, a uma política de marketing inexistente e a uma vocação cármica para depreciar seus ativos e fazer maus negócios, acabam tornando imperceptíveis quaisquer acertos.
E, como uma simples dança de cadeiras não resolverá os problemas do Atlético, se não vier acompanhada de uma revolução de métodos e conceitos de gestão, é mister conhecer em profundidade o que está acontecendo no clube, o que permitirá proteger, blindar e projetar evolução em tudo aquilo que for positivo e profícuo.
A imagem institucional do Atlético é intencionalmente pobre e ruim. Tanto quanto a comunicação institucional do clube é caquética e omissa. Nada é por acaso ou se deve apenas à incúria dos dirigentes. Não é à toa que o Atlético é um dos clubes mais fechados e menos transparentes do país.
Mal o Brasileirão 2019 chegou ao fim, teve início o período mais chato do futebol: O período das ondas, das “notícias” plantadas, da fabricação de pautas, que, somadas ao frenesi da busca de cliques e de audiência, como do aumento das tiragens de jornais, transformam as redes sociais e a mídia convencional, já normalmente inconsequentes, em uma torre de Babel esquizofrênica, cada qual mais dono da verdade do que o outro, mais apelativo e mais tendencioso.
Mas, em relação ao Atlético, o quem vem sendo “noticiado” e especulado nas redes sociais e na chamada grande imprensa sobre a contratação do novo treinador e, principalmente, em relação à saída e à chegada de jogadores, já ultrapassou todos os limites do aceitável, do tolerável, do minimamente razoável.
Algumas “propostas” por jogadores do Atlético, plantadas aqui e ali, são tão risíveis ou surreais que, caso a diretoria as aceitasse seria motivo de intervenção. Como a comunicação institucional do clube inexiste e a direção do Atlético não inspira confiança, qualquer “notícia” frutifica, ganha asas e leva a torcida à loucura. Oferecer jogador e desvalorizar ativo do jeito que vem sendo plantado aqui e ali é uma afronta à inteligência do mais mediano dos observadores.
Tem “notícias” que claramente soam como aquelas táticas surradas e manjadas, utilizadas por dirigentes atleticanos ao longo dos anos: plantar “notas” para testar a torcida quanto a determinados negócios temerários (Cleiton) e para normalizar as saídas de jogadores estupidamente rejeitados (Cazares). Em meio a profissionais sérios, infelizmente sempre tem alguém que se presta a fazer esse papel. E, também, sempre tem torcedor que entra na onda.
Mas, nunca é demais alertar: muito cuidado com o que é dito e repercutido nas redes sociais e na própria imprensa convencional. Não acreditem em tudo o que é dito e publicado por aí, o que não significa, porém, que não devamos exercer extrema vigilância sobre tudo o que acontece com o clube.
É bom lembrar que o Atlético sempre se notabilizou por ser um mau negociante, comprando mal e vendendo pior, que seus negócios sempre vazaram e que o clube sempre pagou caro por isso. E, como não podia ser diferente, a desconfiança da torcida é total.
Assim e, não sem razão, um sinal de alerta está soando forte nas mentes e nos corações atleticanos: é preciso reagir e inibir qualquer negócio que se inspire, seja no ódio e na intolerância que têm demarcado o comportamento de parte significativa da torcida, seja no mercantilismo temerário que tem caracterizado as transações alvinegras ao longo dos tempos, quase sempre premidas pelas dívidas crescentes e pela pressão dos credores, e que possa trazer prejuízos de toda ordem ao clube.
E, quando mais se espera do presidente, ele vem e põe gasolina no fogo.
Nenhum dirigente minimamente preparado pode se referir publicamente a qualquer de seus comandados da forma que o presidente atleticano o fez na sua última entrevista de 2019 em relação a Cazares e a Lucas Hernández. Um erro grosseiro, certamente fruto da emoção, que não pode mais se repetir.
Mas não é só isso. A ideia lançada ao ar de, em um futuro próximo, transferir a sede administrativa do clube, de Lourdes para a Arena MRV, de modo a disponibilizar mais um patrimônio do Atlético para venda, escancarou, no entender de muitos, uma visão mercantilista rasa de priorizar o se desfazer de ativos em detrimento da diversificação, da maximização e do incremento de receitas.
O amadorismo e o primarismo que se depreende da fala do presidente inspira mais cuidados ainda se lembrarmos de algumas situações fáticas, reais, porém não plenamente esclarecidas, vez que, nem ele e nem a comunicação institucional do Atlético nunca se aprofundaram em relação a elas até agora.
A propalada venda do restante do Shopping do Atlético, por exemplo, que segundo alguns tem tudo a ver com a contratação da Ernst Young (ou vice-versa?), merece de toda a torcida muita atenção e vigilância.
É fundamental que seja exigida uma avaliação de viabilidade do negócio, com análise de prognóstico de receita futura em caso de não realização da venda, custo/benefício, valor real de mercado, análise de oportunidade, do retorno do negócio e da relação resultado imediato X resultado ao fim do atual contrato com a administradora do Shopping…
E o que você, presidente e, o próprio Atlético, teriam a dizer sobre essa anunciada venda do Shopping e também em relação às questões enumeradas abaixo?
– Parceria com a Ernst Young (consultoria), cujos termos e limites estão guardados a sete chaves.
– Arena MRV: valor final da obra, agregados, custos excepcionais e eventuais; custo operacional, valor mínimo do ticket para a viabilização do estádio, receitas adicionais, adendos, obrigações, etc..
– Orçamento p/ 2020: incongruências, aumento do passivo, queda de receitas, sócio torcedor (desafios e metas), vendas de jogadores (meta alta e arriscada), etc..
– Trabalho de Chávare na base e projeto para o futebol, com a chegada do novo treinador.
– Clube-empresa: riscos, ameaças, avaliação criteriosa dos prós e dos contra, análise de oportunidade e, havendo alterações na legislação que viabilizem essa transformação, estudos e definição, se for o caso, do modelo ideal para o clube, etc..
Muito se tem dito sobre a queda traumática do Cruzeiro e dos riscos do Atlético seguir a mesma rota da insolvência. Hoje, uma das vantagens do Atlético em relação ao rival é ter o patrimônio líquido positivo, ou seja, o seu passivo é inferior ao seu patrimônio.
Se considerarmos também que o Atlético, ao contrário do rival, está com o Profut em dia e tem a sua dívida bancária taxada pela Taxa Selic, i.e., ao ano, e não ao mês, não é difícil intuir que o Glorioso ainda possui condições favoráveis para administrar a sua delicada situação e ainda fazer uma engenharia financeira inteligente que lhe permita, sem riscos incontroláveis e inconsequentes, administrar o seu passivo, montar um time minimamente competitivo e, principalmente planejar o seu futuro de médio a longo prazo.
Assim, se desfazer de ativos pura e simplesmente pode ser, dentro de algum tempo um tiro no pé.
Ou seja, o Atlético, embora viva um momento que traz muitas preocupações e contenha riscos reais de um desastre de proporções incalculáveis, ainda pode investir em um leque de ações emergenciais que lhe permitiriam fazer frente às demandas inevitáveis do futebol, gerir de forma responsável o seu imenso passivo e projetar o seu futuro.
E não bastasse a complexidade e a importância dessas questões, o sucesso da gestão atual em 2020 dependerá fundamentalmente da saúde da relação clube/torcida. Se continuar mal, o comprometimento dos resultados em 2020 será inevitável.
Questões atinentes à massa atleticana como formas de cobranças, inclusão, participação, representatividade, etc., já estão se impondo em qualquer programa de governança de um clube de futebol faz tempo e não há mais como ignora-las.
Um recado ao presidente: não se furte ao diálogo, discuta as propostas de movimentos como o Renova Galo, ouça as críticas de coração aberto e verá que muita gente estará absolutamente disponível para escuta-lo e apoiá-lo naquilo que se entender que é bom e interessante para o Atlético.
Se quiser terminar bem o seu mandato, presidente, é preciso vencer essa rejeição que já está chegando a limites perigosos. É preciso aprender a conversar a língua do torcedor. É preciso abrir e democratizar o clube, a torná-lo transparente. É preciso entender que jogando com a torcida, presidente, você também vencerá o vento.
O senhor, presidente, disse com todas as letras que as coisas no Atlético são diferentes daquelas que jogaram o rival no fundo do poço. É preciso provar isso na prática. Não basta o discurso. Sua credibilidade está em cheque e, a bem do mundo atleticano, algo precisa ser feito em relação a isso.
Mas, atenção, é preciso saber, entender e não temer o direito do torcedor de apontar e criticar tudo aquilo que ele entender temerário ou ruim na sua gestão.
Se de um lado, é preciso que o presidente Sette Câmara entenda que a Comunicação Institucional do clube deva ser radicalmente reformulada, permitindo ao torcedor conhecer com exatidão tudo o que está acontecendo no clube, de outro, é fundamental ao atleticano também fazer a sua parte, se disponibilizando ao diálogo franco, porém respeitoso, sempre alicerçando cada uma de suas críticas e cobranças.
Acima perguntei ao presidente o que ele e o clube teriam a dizer sobre as questões retro tratadas. Agora, seguindo o princípio matemático da relação biunívoca, pergunto a vc torcedor: o que vc sabe e como vc poderia cobrar, sugerir e ajudar o clube em relação a cada uma destas questões?
Enfim, nem bem o ano novo nasceu, o Atlético, além de fazer o anúncio oficial da contratação de Rafael Dudamel, comunicou que uma reformulação no departamento de Marketing do clube estaria em curso. Faça para valer essa reformulação, presidente. Não existe melhor Marketing do que inspirar confiança.