Cazares e a profissionalização do futebol

 

 

Professor Denílson Rocha
Do Fala Galo, em Belo Horizonte
14/09/2019 – 16h10

Desde que busquei me desenvolver em gestão e negócios, algumas coisas me incomodavam. A primeira delas era chamar de “Administração de Empresas”. Empresa é um tipo específico de negócio e a formação é em Administração (só Administração), o que inclui, mas não se resume a gestão empresarial. O segundo ponto é tratar gestão como uma ciência exata, porque é uma ciência humana. E aí está o X da questão.

Em geral, quanto as pessoas tratam da gestão, o mais comum é falar da questão financeira. É óbvio que a gestão financeira é importante. Só é preciso reconhecer que os resultados financeiros são a consequência do que ocorre nas demais atividades de uma organização. Produção eficiente, serviços de qualidade, marketing adequado, estratégias, inovação… são as tarefas realizadas nas mais diversas áreas de uma organização que geram valor, que transformam matéria-prima em produto, que fazem vendas e que “fazem” dinheiro. E para tudo isso, existe um elemento essencial: pessoas. Gestão se faz com pessoas. Pessoas que produzem, pessoas que vendem, pessoas que tomam decisões… Pessoas!

No futebol não é diferente. São vinte e dois atletas correndo atrás de uma bola, muitos outros trabalhando para transformar o jogo em um evento e milhares ou milhões torcendo por um esporte que parece tão simples mas é repleto de complexidade.

Já tratamos em outro texto que as exigências para o “futebolista” mudaram bastante. Antes era o “boleiro” e a habilidade bastava. Depois veio o “atleta”, quando o vigor físico passou a ser mais exigido. Posteriormente, apareceu o “jogador”, que conhecia do posicionamento e das variações táticas que o jogo impõe. E, mais recentemente, surge a figura do “profissional de futebol”, o ser que joga bola, cuida do físico, conhece as regras e as táticas do jogo e, para completar, é um recurso de publicidade e marketing, que precisa cuidar da própria imagem (e também da imagem do clube) dentro e fora das quatro linhas. Ou seja, é preciso muito mais que “apenas” jogar bola.

Fora de campo também mudou. É preciso ter mais cuidado com as finanças do clube – são BILHÕES em jogo. Também é preciso cuidar da estrutura dos espetaculares centros de treinamento, da logística das viagens, das negociações com TV e patrocinadores, dos uniformes, de eventos, das competições… é muita coisa. E continua tendo um elemento central: é preciso gerir pessoas.

Em todas as áreas de negócio, muito se fala quanto a gestão de pessoas. Tem muito discurso bonito, muita palestra motivacional e bastante distanciamento de práticas efetivas de valorização, desenvolvimento e relacionamento com as pessoas no ambiente de trabalho – futebol também é ambiente de trabalho. Uma coisa é quase unanimidade: não se fala mais em “recursos humanos”. E aí que a coisa complica…

O “jogador de futebol” é um ser humano como qualquer um de nós (apesar de, nos grandes clubes, ter um salário inimaginável para nós, mortais). A pessoa tem o direito de se divertir, ir ao cinema, ao bar, ao restaurante, ao shopping, à praia, viajar nas férias, curtir os amigos e a família e tudo mais que a gente também gosta – até mesmo tomar uma cerveja gelada nesse calorão absurdo. Mas esse direito tem alguns limites… primeiro, porque as exigências físicas da profissão obrigam a ter cuidados com o corpo. Não dá para ficar na balada na noite anterior a um jogo importante, por exemplo. Segundo, e mais importante, quem está no futebol é muito exposto. Não importa aonde vai, sempre tem alguém com o celular a postos para registrar e publicar tudo que está fazendo. Não dá para ir para balada na noite posterior a uma derrota em um jogo importante.

Vários clubes, especialmente os gigantes europeus, já entenderam que não contratam apenas um jogador de futebol. Contratam um ativo importante, que gera ganhos esportivos e financeiros. A avaliação dos atuais “olheiros” – leia-se, analistas de desempenho – não se resume ao que é feito dentro de campo. A vida, as rotinas e o comportamento extracampo são tão (ou até mais) importantes que o que se faz em campo. E temos muitos casos de verdadeiras joias, craques da bola, que não tiveram oportunidades (ou até tiveram várias e não souberam aproveitar) que ficaram pelo caminho porque não souberam se comportar nos dias de folga ou nas redes sociais. 

Toda essa história serve para falar das recentes polêmicas do camisa 10 do Galo. Qualquer pessoa que conheça minimamente de futebol falará que Cazares é diferenciado, genial. É unanimidade falar do seu talento, habilidade e capacidade para decidir jogos. Mas também é unanimidade falar da sua falta de profissionalismo, seja por “sumir” em campo, seja por aparecer demais em polêmicas fora do campo. A conclusão também é unânime: Cazares estaria em um dos gigantes clubes europeus se tivesse a cabeça no lugar.

Quando apronta das suas, Juanito é capaz de nos maravilhar com belos gols e jogadas de extremo talento, mas também nos deixa p. da vida com a displicência, falta de vontade e, especialmente, “aprontações” fora de campo. Quando mostra sua genialidade, temos o melhor camisa 10 em atividade no Brasil e tememos que algum grande clube se interesse em contratá-lo. Quanto mostra sua falta de profissionalismo, temos um camisa 10 irresponsável e torcemos que algum clube (qualquer um) se interesse em contratá-lo.

Se estamos falando de uma pessoa, temos que considerar que todos nós acertamos e erramos, todos nós temos dias bons e dias ruins e todos nós somos pecadores… E isso não é suficiente para convencer nosso chefe que é razoável chegar atrasado com frequência, que o trabalho fica sem qualidade ou que a noite mal dormida e a cervejinha nos deixaram sem condições de trabalhar. É humano, podemos até receber novas oportunidades e orientações, mas, se não mudamos, perdemos o emprego do mesmo jeito.

É importante reconhecer o lado humano do profissional de futebol. Muitos vem de famílias pobres, não recebem a devida orientação educacional, às vezes falta suporte na formação do caráter. Chegam a um grande clube, com salários milionários e o assédio é constante. Alguns se perdem pelo caminho, caem em tentação, vão curtir os prazeres da noite. E a carreira fica comprometida. Cazares parece ser um destes.

No Atlético, o camisa 10 já “pisou na bola” em diversas oportunidades. A genialidade e o lado humano pesaram. Houve orientação e cobrança. Mas Juanito foi parar nas páginas policiais. Não entende (ou não quer entender) as consequências de seus atos. Não respeita a grandeza do Clube Atlético Mineiro, que também foi parar nas páginas policiais em função das ações do jogador.

É preciso persistir na formação e no resgate do ser humano. É preciso insistir na orientação e no acompanhamento da pessoa. Cazares precisa receber a ajuda adequada. Mas também é preciso considerar o patrimônio e a marca do Galo. Não é razoável “dispensar” o atleta porque o clube investiu em sua contratação. Tem muito dinheiro envolvido. Mas o que Juanito faz fora de campo e o que deixa de fazer em campo denigrem a marca do clube. 

Passou da hora do Atlético mudar a postura. O ser humano Cazares necessita de apoio. O profissional Cazares precisa deixar de ser criança mimada e amadurecer, crescer e ser cobrado como adulto. Se quer atuar como profissional do futebol, terá o apoio e a admiração da Massa. Se não quer fazer o que foi contratado e é muito bem pago para fazer, basta pagar pela rescisão contratual e ir embora. Futebol não é mais para amadores e o respeito ao Atlético começa por quem está dentro do próprio Atlético.

 

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Edição: Ruth Martins
Edição de imagem: André Cantini