Coluna Preto no Branco: O pior cego é aquele que não quer ver

*ESTE TEXTO É DE RESPONSABILIDADE DO AUTOR. NÃO REFLETE NECESSARIAMENTE A OPINIÃO DO PORTAL

Por Max Pereira, colaborador independente

Dizem que para bom entendedor um pingo é letra. Mas, infelizmente, muitos sequer enxergam o pingo ou pior, fazem questão de não enxergá-lo.  Há tempos venho observando que em suas entrevistas coletivas dirigentes, treinador e jogadores vêm dando recados, alguns cifrados, outros de forma explícita.          

Em momentos distintos, por exemplo, Arana e Hulk, falando em nome do grupo, segundo deram a entender, elogiaram o técnico Antônio Mohamed e deixaram claro que os jogadores gostam dele e aprovam o seu trabalho. E em vídeos e fotos que espalharam frequentemente pelas redes sociais, os atletas atleticanos não se cansam de mostrar que o ambiente entre eles é o melhor possível, que eles gostam uns dos outros e de estar e de jogar juntos. Alguém duvida disso?

Por sua vez, o diretor Rodrigo Caetano disse um sem número de vezes em entrevistas que concedeu tanto a veículos da mídia convencional quanto da mídia alternativa, que é muito pressionado para vender jogadores. Recado? Pedido de socorro?

Até as saídas de Borrero, Tchê Tchê e Savarino, o Turco fez, em todas suas entrevistas coletivas, questão de dizer que, para seu trabalho dar certo, era fundamental ter à sua disposição um elenco largo que, em bom espanhol, significa recheado em qualidade e em opções. Aliás, o Turco não teria pedido para que o clube não vendesse e nem emprestasse ninguém até pelo menos o final do campeonato mineiro? Pediu por quê? Por que pediu?

De repente, sem quê e nem prá quê, Zaracho dá uma entrevista admitindo que as coisas podem mudar e ele pode ir respirar outros ares. Coincidentemente o seu futebol caiu assustadoramente.

Há algum tempo, Hulk revelou que chegou a pensar em rescindir o contrato com o Atlético e que não estava feliz. O choque de realidade que ele deu em Cuca o fez encontrar a felicidade no clube. E do nada, o incrível atacante atleticano vem a público revelar que tem recebido sondagens, mas que está feliz em BH e no Atlético. Mas, por que ele quis revelar que tem recebido propostas e, ao mesmo tempo, deixar claro que vincula a sua permanência do clube à felicidade? Será que ele estaria querendo dizer que se a felicidade acabar não mais teria porque continuar no Galo. Seria mais um recado?

Após a derrota para o América, Keno, revelando um nervosismo incomum, bateu boca com um repórter. Nesses últimos jogos nos quais o Atlético vem mostrando uma brutal queda de rendimento, vários jogadores têm se mostrado bastante tensos e, ao mesmo tempo, dispersos em várias jogadas. Arana chegou a reclamar publicamente da Conmebol não ter sido eleito o melhor jogador em campo na vitória contra o América. Há um clima de tensão, irritação e descontentamento no ar. Isso é sintoma de uma doença que vem se alastrando no clube.

Está ficando claro que o Turco sozinho não tirará o time dessa rota que o está levando a um abismo imensurável. Ele já não consegue fazer o time jogar. Os sinais, ora implícitos, ora explícitos de que as coisas não estão indo bem intramuros do Atlético são cada vez mais claros.

O que aconteceu com aquela dinâmica, aquela intensidade, aquela volúpia e aquela postura ativa que fizeram do Atlético o terror dos adversários e o time a ser batido? O contraste entre a apatia mental e a falta de atitude que o time atleticano vem mostrando nesses últimos jogos e o jogo avassalador que este mesmo Atlético já mostrou que é capaz de desenvolver em campo É ASSUSTADOR.

Os jogadores atleticanos se impunham aos rivais não apenas técnica e taticamente. Mas, também e não raras vezes, moralmente, na cara feia e até com alguma pancada eventual. Diferentemente do anormal nervosismo e da apatia mental que um número crescente e preocupante de jogadores vem exibindo nas últimas partidas, estes mesmo atletas esbanjavam personalidade e altivez. Aliás, estes mesmos jogadores já conseguiram render um futebol interessante e de boa qualidade sob o comando de Mohamed. Estranho, não?

Ah! Mas agora o galo está enfrentando nessas três competições que vem disputando simultaneamente adversários de melhor nível do que aqueles com os quais se defrontou no Campeonato Mineiro. Uma verdade que, porém, apenas escancara que o clube cometeu uma falha imperdoável de planejamento. É que, enquanto os adversários atleticanos apenas executam dentro de campo, de forma organizada e aplicada, o jogo proposto pelos seus treinadores, objetivando se manter na elite sem sustos, o Atlético deveria estar se cuidando para produzir dentro das quatro linhas um jogo compatível com a sua obrigação orçamentária de lutar pelos títulos. Os méritos dos adversários não podem esconder os deméritos do Atlético.

Será que ainda tem alguém que duvida que algo de muito ruim está acontecendo dentro do Atlético? O que levou este time a ficar tão moralmente abatido, sem atitude e sem coesão coletiva? O melhor que podia acontecer para o Atlético no último clássico contra o América acabou acontecendo: PERDER O JOGO. E, parece, que o alerta vermelho foi ligado. Parece. Contudo, se os comandantes do clube, além de vender o SHOPPING e outros jogadores tão mal como vêm fazendo, demitir o treinador sem atacar os problemas na raiz, estarão errando grosseiramente e mergulhando o Galo de vez em um poço sem fundo.

Uma boa discussão foi proposta pelo amigo e galista visceral Gilberto de Almeida. O time está mal tática e coletivamente porque o emocional está dançando em razão de problemas mal resolvidos que estariam corrompendo o ambiente ou os problemas emocionais e a impotência do time seriam a causa desse desarranjo tático e da consequente queda brutal de rendimento do time? Quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha? Seja qual for a resposta o fenômeno vai se retroalimentando e se potencializando em uma espiral crescente e devastadora.

Nos meus artigos na semana passada (Fala Galo e Canto do Galo) e, portanto, antes da pífia atuação do Atlético diante do América e da mais que justa derrota para o Coelho, eu já havia antecipado que algo de estranho estava acontecendo intramuros do clube.

E vale repetir: sozinho, Mohamed não vai conseguir melhorar o time. E, com um elenco cada vez mais reduzido, com menos opções, com o grupo cada vez mais desgastado e com a cabeça cada vez pior, Mohamed vai buscar se agarrar em soluções que dificilmente darão certo como, aliás, estes últimos jogos vêm mostrando. A cabeça do próprio treinador também começa a dançar e quando ele mais precisa de estrutura, ambiente bom, opções e planejamento, o comando só fala em vender, vender e vender.

Para muitos, Turco estaria se perdendo em razão de uma teimosia estúpida. Eu diria que o que chamam de teimosia é algo com que toda diretoria tem que saber lidar com qualquer que seja o treinador de plantão. De uns tempos para cá, a relação dos treinadores com os clubes e com os elencos mudou para sempre. Os treinadores, brasileiros ou não, passaram a cultivar a teimosia e a vaidade em relação ao seu saber e à sua capacidade como grandes qualidades. E muitos acabam morrendo abraçados com elas e seus trabalhos ruins. E a cultura tupiniquim que molda a relação clube/treinador é um tremendo complicador.

É verdade que em 2021 Cuca só engrenou depois de passar por um choque de realidade. Mas, é verdade também que, ao contrário de Mohamed, ele teve durante toda a temporada planejamento e elenco largo para explorar e lastrear o seu trabalho.

Não custa por fim, lembrar que atacar jogadores e o treinador como está acontecendo nas redes sociais não ajuda em nada ao Atlético. Apenas esconde os verdadeiros problemas. Como já dito acima, estes mesmos jogadores já renderam muito mais coletiva e individualmente com o Turco no comando. Não é hora de fazer caça às bruxas e nem de execrar este ou aquele jogador em razão de uma birra qualquer.

O pior cego, aquele que não quer ver, pode jogar o restante de 2022 definitivamente no ralo.

*ESTE TEXTO É DE RESPONSABILIDADE DO AUTOR. NÃO REFLETE NECESSARIAMENTE A OPINIÃO DO PORTAL