Coluna Preto no Branco: a Hidra de mil e uma bocas e o loop Atleticano
Foto: GE
Max Pereira
06/10/2020 – 06h
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Filha da maldade e do ódio, os dois mais poderosos monstros da mitologia contemporânea, a HIDRA ATLETICANA é a versão moderna da Hidra de Lerna (em grego antigo: Ὕδρα”) que, na mitologia grega, era um monstro, filho de Tifão e Equidna, que habitava um pântano junto ao lago de Lerna na Argólida, que hoje equivaleria à costa leste da região do Peloponeso.
A Hidra da mitologia grega foi criada por Hera para matar Héracles (Hércules, na mitologia romana), filho de seu marido o Deus dos deuses Zeus e da mortal Alcmena.
Se a sua ancestral, a Hidra de Lerna, tinha corpo de dragão e várias cabeças de serpente que, segundo algumas versões da lenda, quando cortadas podiam se regenerar até em dobro, a hidra alvinegra, bem à moda do século XXI, tem mil e uma bocas que se multiplicam infinitamente graças à mídia e às redes sociais. E ainda geram filhos. E haja X9 na historia do Galo.
A Hidra da mitologia grega matava os homens apenas com o seu hálito e os comia. E se alguém chegasse perto dela enquanto ela estava dormindo, apenas de cheirar o seu rastro a pessoa já morria em terrível tormento.
Mas não se enganem. A hidra atleticana é incomparavelmente mais venenosa e letal. Ela mata reputações, aniquila a autoestima, destrói carreiras, envenena espíritos e endurece corações.
Instruído por Atena, o filho de Zeus, após matar a Hidra, aproveitou para banhar suas flechas no sangue do monstro, com o objetivo de torná-las venenosas. E foi a sua ruína.
Héracles morreu, mais tarde, na Frígia, por causa do veneno da Hidra. Após ser ferido mortalmente por Hércules com flechas envenenadas no sangue da Hidra, o centauro Nesso deu seu sangue a Dejanira, dizendo que era uma poção do amor, para ser usada na roupa.
Dejanira acreditou, e, quando sentiu ciúmes de Hiole, usou o sangue de Nesso para banhar as roupas de Héracles, que sentindo dores de queimadura insuportáveis, preferiu o suicídio na pira crematória.
Nesses tempos de fake news, regados pelo sentimento da moda, o ódio, todo o veneno que sai das bocas da hidra moderna não ferem de morte tão somente a quem se deixa levar e inocular. É que, assim como aconteceu com o homem mais forte que já teria existido, um semideus para muitos, o feitiço geralmente se volta com o feiticeiro e as consequências são avassaladoras.
Tal como o veneno da Hidra de Lerna, as palavras vãs lançadas ao vento se espalham e se multiplicam, destruindo tudo e a todos, inclusive quem as proferiu.
Assim acontece com o Atlético de hoje. Há muito nutro a convicção de que o maior inimigo do Atlético é ele próprio. O dia que conseguir derrotar a si próprio o Glorioso se tornará imbatível.
E como o Atlético conseguiria neutralizar os tentáculos dessa Hidra que ele próprio vem cultivando em seus intestinos há anos e anos, em um loop infernal e destrutivo?
Venho defendendo que uma das características endêmicas do Atlético é o paradoxismo. E por isso, está exatamente nessa qualidade, a saída para este imbróglio cármico.
É que, por mais contraditório que seja, o Galo, ao mesmo tempo em que atrasa salários, acumula uma divida exorbitante, vê suas receitas despencarem, se submete cada vez aos seus parceiros mecenas, também constrói sua Arena com recursos próprios, investe mais de 130 milhões em contratações, incluindo a de um treinador de renome internacional, ensaia uma reforma administrativa, com a qual parece romper com conceitos e métodos arcaicos de gestão, lança seu Portal de Transparência (??!??), assume a liderança do campeonato brasileiro e se cacifa para ser um dos protagonistas do futebol brasileiro e, talvez, mundial. E tudo isso, se bem gerido, pode neutralizar a hidra atleticana.
Natural, por outro lado, que tudo o que está acontecendo de alvissareiro no clube incomode a gregos e troianos que se aproveitam das fragilidades da instituição e dos erros de seus dirigentes para desestabilizá-la e tentar melar os seus projetos. Mas, até quando vai ser natural que o Atlético seja convulsionado pelos venenos que ele próprio destila?
Tanto quanto precisa aprender a se equilibrar entre o exercício da transparência e o proteger e blindar os seus segredos de negócio, o Atlético tem que romper com paradigmas rançosos e investir de vez em uma administração moderna e profissional, onde a comunicação institucional seja firme, clara, objetiva e elucidativa.
Este processo é longo, onde os erros e os acertos disputarão espaço e as resistências e as armadilhas se farão presentes e os maremotos frequentes. A dubiedade consequente de todo esse processo e que hoje é a marca da comunicação atleticana tem, não só provocado rombos na credibilidade de dirigentes do clube, como também alimentado todo o tipo de ataque desestabilizador. Por exemplo:
Era apenas um mês de atraso de salários? Ou eram dois meses? Os salários que foram pagos no dia 2.10, com a ajuda dos parceiros, se referiam ao mês de setembro ou de agosto do corrente ano? E os salários quitados em 19.10 se referiam a que mês, julho ou agosto? E a que mês se referem os salários que vencerão no próximo dia 10? Setembro? Outubro?
Confuso não? Mas foi assim que o Atlético tratou o tema e informou à sua agitada torcida. Por que não dar logo os nomes aos bois e não deixar qualquer duvida a respeito?
E o custo da obra da Arena? Os acréscimos foram de 40, 50, 100, 140, 150, 200, 300, 340 ou 350 milhões de reais. E, seja qual for o valor correto, quais as razões que o justificam? Este emaranhado de números foi especulado aqui e ali, deixando um rastro de duvidas, indagações e especulações maldosas.
Não seria mais fácil, racional e transparente já ter informado aos interessados com todas as letras que o acréscimo de 40 milhões é referente ao aumento natural no preço da construção em razão de atrasos da obra, que o dinheiro da venda do Shopping rendeu mais que isso no mesmo período, que os 100 milhões citados se referem a condicionantes exigidos para que a obra fosse autorizada, o que é normal em qualquer empreendimento, que obras de preservação e vias de acesso, relativas a tais condicionantes, deverão ser pagas com a venda de cadeiras cativas, que atrasos em obras são normais e que os outros 200 milhões se referem ao que o Galo deixa de faturar em dois anos devido ao atraso da obra e, portanto, são apenas uma projeção?
Da forma como essa variação do custo da obra foi colocada inicialmente, transpareceu para muitos como uma exploração midiática que estaria misturando a politica interna do clube com as próximas eleições municipais.
E isso, conforme se depreende das redes atleticanas, não foi bem visto por parte significativa da torcida. E não poderia ser diferente, pois essa mistura é explosiva e pode causar estragos insanáveis. Ainda bem que Rubens Menin veio a publico e colocou os pingos nos is em relação a estes números, antes que os danos dessa trapalhada fossem irremediáveis.
O Atlético dos sonhos de seu torcedor só será possível se o clube conseguir sair desse loop de crises geradas pelas suas próprias idiossincrasias que o fazem quase sempre dar mote aos seus detratores e a reagir de maneira inadequada à influência de agentes externos.
E tal e qual o peixe que morre pela boca, a hidra atleticana acaba por intoxicar gravemente o próprio clube, tal o volume de veneno que jorra pelas suas mil e uma bocas que, como um maldição, vão se multiplicando indefinidamente.
A boa noticia, embora muitos ainda não o saibam, é que cada atleticano tem a força e a habilidade de um Hércules. Juntos, podemos neutralizar a hidra alvinegra e transformar de vez o Galo naquela potencia tão sonhada. E, a exemplo do filho de Zeus, temos muito trabalho pela frente. Mãos à obra. Ah! Diferentemente do mito grego, sem o risco de cometer suicido.